Logo pela manhã
o calor forte já indicava que aquele era mais um típico sábado de verão, e o
Sol que lhe era peculiar prometia fazer dos planos daquele grupo de amigos um
sucesso. Claro que ao final da tarde a chuva era inevitável, mas nada que
estragasse a programação daqueles jovens, muito pelo contrário, era excelente
para diminuir um pouco o calor já que ao final do dia esse fator, somado à bebida
ingerida e à farta comida consumida trazia a todos moleza e preguiça, mas isso
já era costumeiro.
As
bebidas, basicamente cerveja e uma receita de batida de amendoim caseira, já
estavam gelando desde a noite anterior e Hanz terminava de temperar a carne
enquanto curtia uma musiquinha e conversava com Brutus, seu amigo e
guarda-costas, um Rotweiller de quase um ano.
-
Olha Brutus, vê se hoje você não pula na galera quando eles chegarem, tem gente
que não gosta heim, e não quero ter que ficar mandando, se comporta.
O
cachorro, que sentado à porta da cozinha que dá saída ao quintal, admirava
maravilhado aquele festival de carnes e ficava apenas observando seu dono
naquela árdua tarefa culinária.
Sua vontade provavelmente era de se apossar
daquela bacia lotada de carne e se empanturrar mas isso pouco lhe seria
benéfico diante da autoridade de seu dono, que lhe imporia como penalidade
suplícios inimagináveis de acordo com seu estado de espírito naquele dia. Ele
não fazia idéia de que tipo de suplícios ele seria capaz de impor já que nunca
Hanz havia lhe imposto nenhum antes, mas era mais prudente não dar motivo para
descobrir.
- Vê se obedece meu, se o pessoal reclamar eu
vou te trancar lá no fundo heim!!! – prosseguiu Hanz em sua advertência, já levando
a bacia com a carne para a geladeira percebendo o olhar guloso do animal.
Brutus apenas se limitava a estender a língua
deixando a mostra sua salivação faminta.
O
guarda-costas só abandonou seu posto quando ouviu a buzina familiar em frente ao
portão.
Parece
que as recomendações do dono foram inúteis pois Brutus já se encontrava a
postos para recepcionar os convidados que começavam a chegar.
- Calma aí Renzo, já to indo aí!!! – gritou
Hanz da porta da cozinha antes de ir buscar as chaves.
-
Eheheh, e aí Cara-Preta como você ta grandão? O preguiçoso do seu pai já
arrumou as coisas? – Renzo adora esse animal, pelo seu biotipo aparentaria
melhor ser o dono do cachorro, e era como se o fosse, tamanha afeição que
nutria por ele que o levava para passear de vez em quando.
- E
aí meu, beleza? Como que você tá?
- Ah, tudo certo fiu. Pra variar briguei com a
Bi ontem, mas tudo bem. Olha aqui o que eu trouxe... aquela maionese que minha
mãe faz...
- Bom, menos mal, se trouxe a comida... as
brigas de vocês já não são novidade.
Hanz
saúda o amigo, que também é saudado pelo amigo Brutus que quase derruba a
travessa de salada de maionese que ele trazia.
- Porra Brutus, eu acabei de falar meu!! –
grita Hanz com o desobediente animal que o ignora por completo.
Renzo de desvencilha do mesmo e ruma à
geladeira para guardar a preciosa encomenda.
- É Brutus, sossega cara, eu gosto de você
mas se eu derrubar essa maionese você toma umas bica!
- Toma mesmo, essa salada é tesão!!! Sua mãe manda bem nessa maionese meu!!! Deixa eu prender esse bicho, a mina do Paulão não curte cachorro e não adianta mandar ele deitar porque ele não vai ficar deitado o dia todo também né, você conhece bem ele.
- Toma mesmo, essa salada é tesão!!! Sua mãe manda bem nessa maionese meu!!! Deixa eu prender esse bicho, a mina do Paulão não curte cachorro e não adianta mandar ele deitar porque ele não vai ficar deitado o dia todo também né, você conhece bem ele.
Hanz leva o animal aos fundos da casa, no que
é acompanhado pelo amigo.
- Por falar em tesão, a Tati disse se vem? –
indaga o corpulento rapaz em tom sarcástico.
-
Não fala assim pô, você sabe que eu não curto essas idéia sua. E outra, você já
tem dona não tem não? Fica na sua meu, parece doido...
- Ahahahahaha, ciuminho é fiu? Sossega
cara, eu só to zuando, você sabe que ela não faz o meu tipo. E outra, eu curto
minha mina apesar da gente brigar pra caramba.
- Beleza, eu sei disso, mas esquece desses
papo cara, você não tem outro assunto pra falar não? Não sei por que
você pega tanto no pé dela.
- Ah fiu, nem é por nada, é porque eu tinha
que pegar alguém pra azucrinar né, e ela foi a sorteada.
Hanz olha para o amigo com olhar de
desaprovação, mas Renzo não se importa muito com isso. Na verdade ele não passa
de um brincalhão, e todos sabem disso.
Os dois vão para a sala acompanhados de uma
cerveja cada um para se distrair enquanto aguardam o resto do pessoal chegar,
Renzo costuma sempre ser o primeiro a chegar e também a ser o último a sair.
Tatiana sempre foi alvo de brincadeiras por
parte de Renzo por causa do seu jeito despojado e até meio masculinizado de
ser, mas não era nada sério, todos ali se davam bem, mas ainda assim Hanz
sempre a defendia, não apenas para tentar manter a paz entre os amigos como
também por ambos já terem passado um pouco da linha da amizade uma vez há algum
tempo. Mas isso não teve maiores conseqüências e eles consideravam o ocorrido
como um acidente de percurso mesmo com o ocorrido tendo-os aproximado mais.
O desejo de manterem algo sério não existia em
nenhum dos dois.
Hanz
até então só tinha se relacionado com garotas que eram mais seu estilo, não
patricinhas, mas também não motoqueiras, enfim... e Tatiana preferia se
relacionar mais com rapazes que faziam mais seu estilo, ou seja, o acontecido
não havia sido nada mais que uma obra do acaso.
- Poxa Hanz, você tá com uns sonzinhos bem
legais aqui heim fiu, pena que você é fresco e não empresta. – fala o
grandalhão fuçando nos cd´s do amigo.
- Bom, eu nem falo mais nada sobre isso, você
sabe que não gosto de emprestar, se quiser eu copio o cd pra você no computador
e tals, mas emprestar eu não empresto mesmo. Mas fala aí, você e a Bianca
brigaram porquê dessa vez? Você andou aprontando é?
- Ah Hanz, nem foi nada disso fiote, foi o
mesmo papo de sempre, ela fala que se sente deslocada nas reuniões do pessoal
porque a gente conversa sobre uns papos que ela não entende, essas coisas de
sempre. Daí ela disse que não viria e insinuou que eu também não viesse, mas eu
disse que viria de qualquer jeito, que se ela não queria vir o problema era
dela. Daí foi isso, ela foi embora pra casa dela emburrada comigo. Mas nem
esquenta, eu mesmo nem ligo mais, é sempre a mesma coisa fiu.
- Puts, é fogo, ela é gente boa, mas
realmente todo mundo sabe que ela não curte mesmo as coisas que a gente gosta
de conversar, ela vive num mundinho nada a ver com o nosso, e em compensação a
gente também fica boiando quando ela tenta puxar algum assunto, daí fica um
clima esquisito mesmo. Só não entendi porque ela não queria que você viesse,
mas daí já é coisa de vocês. Eu sei que você gosta dela, mas que vocês não tem
nada a ver isso não tem mesmo, mas enfim, mistérios do amor não é verdade?
- É fiu, eu sei disso, mas eu gosto dela
né, você sabe. Daí ela disse que não viria comigo hoje, provavelmente ela deve
ter ido pro clube com as primas dela.
Mas desencana, depois a gente faz as pazes, é sempre assim...
- Pior que é. Vamos ouvir um som pra animar
que é melhor. Esse aqui você vai curtir. – Hanz finaliza o assunto, colocando
um cd do Cradle of Filth no aparelho.
Dá pra ver que Hanz acerta o gosto musical do
amigo, pois Renzo gosta bastante da música da banda, embora fosse a primeira
vez que ouvia uma música deles.
- Pô fiote, muito legal o som dos caras heim,
curti. Não empresta mesmo? – Renzo ainda faz uma última tentativa, mas já
sabendo que Hanz não emprestaria, ele jamais empresta cd´s dele pra quem quer
que seja.
Hanz
só olha pra ele, pois não há necessidade de resposta.
Logo já se percebe que a namorada de Renzo
é totalmente alienada em relação aos assuntos que os amigos costumam debater
nas reuniões e isso gera muitos desentendimentos entre o casal, que sempre se
reconcilia, mas que todos tornam evidente ser esse um fato que faz com que a
presença da garota nas reuniões não seja muito apreciado visto que ela só se
preocupa com assuntos como shopping, clube, moda, etc ao invés de assuntos mais
engajados e preferidos pelo círculo de amigos.
De início Renzo pareceu se chatear com isso,
mas com o tempo percebeu que o grupo não repudiava sua namorada, mas sim, que a
presença dela tornava desconfortável a abordagem de certos assuntos, e ele
deixou de dar importância a isso.
Dentro em pouco o ronco do motor da moto estacionando
em frente ao portão denunciava a chegada de mais um integrante do grupo de
amigos, Tatiana.
- Deixa eu abrir o portão pra ela, e vê se
você manera nas piadinhas pra não estressar ela heim meu.
Renzo está entretido colocando um cd do Bon
Jovi no aparelho de sim e parece ignorar a recomendação do amigo mas uma
risadinha denuncia que ele ouviu o que Hanz disse.
Logo os dois entram na sala e Tatiana já
saúda Renzo opinando sobre “quase” tudo, como sempre.
- E
aí Rê, tudo bem? Puts, o que vocês tão ouvindo... Bom Jovi é? Meu, to
estranhando vocês heim. Os dois sozinhos, uma cervejinha, musiquinha melosa,
fala sério!! Que boiolisse heim!!
- Ai
ai, Tati, você é fogo!! Não tem nada de boiolisse aqui não, eu curto o som dos
caras, você pensa o quê? Por baixo desses músculos existem sentimentos, mesmo
que isso não seja muito aparente.
Hanz se diverte observando a conversa dos
dois, que parece não mudar nunca de gênero, um cutucando o outro, sempre.
- Sentimentos é? Um monstro que espanca meia
dúzia por noite possui isso? Você tá zuando comigo né Renzo?
- Ossos do ofício Tati, só faço isso com quem
não sabe se comportar, se todos fossem civilizados não tinha motivos pra eu
debulhar os caras. E não tem sentimento algum envolvido nisso, apenas cumpro a
minha obrigação. Se algum dia você for lá e fizer alguma cagada eu te chuto pra
fora como qualquer outra pessoa. Amigos, amigos, profissão à parte.
Hanz não se agüenta e cai na gargalhada,
no que é seguido por Renzo, deixando Tatiana ainda mais irritada.
- Ah ta, claro, isso eu queria ver. Faz
isso e depois muda de país seu troglodita. E sabe quando eu vou aparecer lá no
Chopp? Nunca!!! Odeio aquele antro de patricinhas, me dá nojo aquilo.
- Bom, menos mal, é menos uma pra me dar
trabalho.
As risadas não cessam.
-
Hanz, vou tomar um banho rápido, esse calor ta de matar, e com o capacete e o
macacão, você imagina como eu tô né?
O anfitrião faz sinal positivo com a cabeça.
- Moto é muito legal, adrenalina pura, mas com
o calor que faz nessa terra é de matar mesmo, não sei como você agüenta. –
concorda Renzo.
- Isso é, tem esses problemas, mas é muito
bom. Um sentimento de liberdade, a adrenalina... nossa, é muito bom mesmo!! Mas
sei lá, cada um é cada um. Talvez um dia vocês venham a gostar. Pra mim não tem
nada melhor.
Hanz se espanta, difícil ver os dois
concordarem em alguma coisa.
- Esse é um prazer que eu dispenso. Acho moto
muito legal, são bonitas e tudo o mais, mas eu mal ando na garupa, nem faço
idéia de como se pilota isso e confesso que não tenho o menor interesse em
aprender. Já vi acidentes horríveis envolvendo motoqueiros. Pô, só de lembrar
já me dá até arrepio. Tô fora.
- Um dia você perde o medo Hanz, no começo
é assim mesmo. Bom, vou tomar meu banho e já volto. Tenho algumas coisas aqui
na bolsa, não precisa se preocupar que não te dou trabalho nenhum. Ah, e por
favor, troquem de música né? Coloquem alguma coisa mais pesadinha, pode ser?
Renzo concorda, batendo continência.
-
Esses dois se amam!! – exclama Hanz jogando-se pesadamente no sofá.
-
E o senhor Jean só volta amanhã mesmo Tati? – indaga Renzo.
- Pelo que ele me disse, sim, veremos os
“brinquedinhos” novos que ele vai trazer. Bom, deixa eu ir pro banho. – fala
ela tirando uma toalha da bolsa e indo para o banheiro. Renzo se aproxima do amigo e cochicha com ele.
- Aí fiote, se quiser eu dou um rolê e deixou
vocês mais a vontade.
-
Valeu Renzo, mas nem precisa não. E nem ia adiantar nada, já, já o pessoal tá
chegando aí. Valeu pela intenção tá? – fala ironicamente Hanz.
Renzo não tira da cabeça a idéia de ele
tem que se envolver com Tatiana, por mais que o amigo diga repudiar tal idéia,
mas nunca perde a oportunidade de voltar ao assunto.
Nesse meio tempo em que a moça se banha e os
dois ouvem música a monotonia só é quebrada pelo toque da campainha e os
conseqüentes latidos de Brutus do fundo do quintal.
O dono da casa atende a Paulo e Cibele,
que completam a lista de convidados da festinha.
O encontro de Paulo e Renzo é digno de nota:
-
E aí grande Renzo, tudo em ordem?
-
Aê chefe PP como você tá fiote? – os dois se cumprimentam como se não se vissem
há muito tempo, ainda que trabalhando no mesmo lugar. Ambos trabalham numa
boate da moda onde Renzo é segurança e Paulo é Dj, conhecido como Dj Paulo
Preto, apelidado de PP por Renzo.
- Cadê a Tati? A moto dela tá aí na frente. –
indaga Cibele, namorada de Paulo, ansiosa por uma presença feminina naquele
ambiente.
- Já deve estar saindo do banho, vou pegar
umas cervejas pra vocês, calma aí que eu já volto. – esclarece Hanz, rindo do
cômico encontro dos amigos, coisa rara de ser vista, pois fora do círculo de
amizades o rapaz descendente de alemães costuma ser bastante sério.
-
Por que não trouxeram o moleque Ci? – indaga Renzo à bela morena sobre seu
filho de três anos, fruto de antigo relacionamento.
- A tia dele ia levar os filhos ao zoológico e
acabou levando ele junto, é bom que assim eu tenho uma folguinha.
A bizarrice da cena se resume nos amigos
mantendo um diálogo, ao menos tentando, com uma música da banda Rammstein em
alto volume. Pra quem vive em boate isso não é empecilho mas para aqueles que
não costumam freqüentar tais ambientes com certeza é algo bastante irritante.
Tatiana adentra o local cantarolando a música
que dessa vez parece agradá-la, cumprimenta o casal recém-chegado e faz um
sinal positivo para Renzo, confirmando que dessa vez a música a agrada.
Hanz
retorna trazendo as cervejas.
- Poxa, esqueceu a minha heim!! – reclama Tati.
Acalmem-se, não se trata de uma festa de
fugitivos dos alcoólicos anônimos, mas com o calor que faz naquela época do ano
e visto que estão no início de um churrasco, nada é mais compreensível.
- Calma Tati, já pego a sua. Vamos lá pra fora pessoal, começar a
arrumar a churrasqueira e tal senão a carne só fica pronta para a janta.
Todos concordam com ele.
- PP vai assar a carne hoje? Pô, da última vez
que você fez ficou dez!!! – fala Renzo
-
Por mim tudo bem, eu gosto de ficar na churrasqueira, se ninguém se incomodar.
-
Que é isso Paulo, vai fundo, seu churrasco é muito bom!! Pelo menos eu
curto...– concorda Tatiana.
Como podemos perceber o sábado
transcorreria animado como sempre acontecia nas reuniões entre os amigos.
Nada de mais num grupo de jovens amigos que se
reúnem num final de semana para um churrasco, mas essas reuniões tinham algo
muito mais sério do que poderia aparentar.
O engraçado é que o desfecho mais sério dessas
reuniões se iniciou espontaneamente, sem que nenhum deles pudesse imaginar que
de simples conversas e debates eles viessem a se tornar bem mais do que meros
amigos.
Mas tudo isso iniciou-se há algum tempo, e
muita coisa aconteceu até chegarem ao estágio em que se encontram.
Isso é o que será contado a partir de agora, até chegar ao momento de dar seqüência aos acontecimentos, pois é necessário entender a forma como as coisas aconteceram...
Isso é o que será contado a partir de agora, até chegar ao momento de dar seqüência aos acontecimentos, pois é necessário entender a forma como as coisas aconteceram...
Nenhum comentário:
Postar um comentário