“Nunca tinha passado por ali antes e se
perguntava como jamais tinha ouvido falar num
lugar tão bonito.
A estrada era plana, bem cuidada e cortava um
imenso campo florido que se perdia no horizonte. Não sabia como tinha chegado
ali, a estrada que o levava de volta para a capital era bem diferente daquela.
Hanz procurou por alguma placa de sinalização que indicasse as cidades próximas
mas ao longo do caminho não havia nenhuma nem mesmo para advertir sobre o
limite de velocidade a ser respeitado, o que lhe causou estranheza. Prosseguiu
por mais alguns minutos e a única coisa que conseguiu ver foi uma pequena casa
perdida em meio a todas aquelas flores. Curioso por saber onde estava ele
pensava:
“Poxa, deve ter alguém naquela casa que possa
me dizer onde estou. Preciso descobrir que lugar é esse pra poder voltar aqui
mais vezes.” – e encostou seu carro o mais próximo possível da pequena casa.
Sentiu o ar puro e fresco que lhe preencheu
os pulmões, ar esse que ele não conseguia apreciar confinado dentro do carro.
Procurou por alguma trilha que o levasse até a casinha pois estava com pena de
pisar sobre tão bem cuidado jardim, mas não conseguiu encontrar nenhuma.
“É, infelizmente não vai ter jeito...” –
pensou ele adentrando pelo jardim em direção à pequena casa. Durante esse
relativamente longo trajeto pôde contemplar o céu de um azul incomparável,
totalmente sem nuvens, e maravilhou-se também com isso.
“Poxa, não dá pra acreditar que hoje em dia
ainda existam lugares como esse, onde será que eu estou? Será que errei o
caminho?” – indagou ele já quase chegando ao seu destino.
Quando finalmente alcançou a bem cuidada casa
ele sentiu a tranqüilidade que o local emanava. Suas paredes de um amarelo
suave e a porta de um branco incomparável davam a entender que elas haviam sido
pintadas recentemente pois estavam muito bem cuidadas.
Procurou por algum barulho que indicasse
haver vida naquele lugar, mas somente era possível ouvir o canto de alguns
pássaros ao longe, a casa estava silenciosa. Hanz então resolveu bater à porta
e como resposta teve uma tranqüila voz masculina pedindo-lhe que entrasse.
O rapaz fez então o que lhe havia sido
solicitado e encontrou um senhor que estava sentado de costas para a porta e
que, sentado, debruçava-se sobre algo que parecia ser uma escrivaninha.
- O senhor me desculpe se estou incomodando...
– disse Hanz educadamente pois o homem parecia estar ocupado.
- Entre rapaz, não incomoda em nada, eu já
tinha praticamente terminado... – interrompeu-o o senhor virando-se.
Hanz sabia que aquele homem era totalmente
estranho para ele, sua fisionomia demonstrava isso, mas o olhar e o sorriso
eram-lhe familiares.
Um imenso carinho transbordava dos olhos
daquele homem que trajava um simples, porém caprichoso, macacão semelhante ao
de um jardineiro.
- Que bom que chegou Hanz, eu estava à sua espera.
– disse o senhor aproximando-se e lhe dando um carinhoso abraço.
Como aquele homem sabia seu nome? O carinho
que ele lhe demonstrava era o de quem já o conhecia muito bem mas Hanz jamais o
tinha visto, ou se tinha, havia se esquecido dele. Hanz teve vontade de
perguntar à ele de onde o conhecia, mas acreditou que seria indelicado de sua
parte, seria constrangedor esquecer-se de alguém que tinha por ele tamanho
carinho.
- Fico feliz que tenha chegado, sente-se,
logo as outras visitas estarão chegando também. – convidou-o o amável senhor
indicando-lhe uma poltrona.
- Outras visitas? Vem mais alguém aqui hoje?
Quem? – Hanz não conseguiu disfarçar sua curiosidade.
- Ora, ora, quando os outros souberam que
você estaria aqui hoje eles quiseram vir para falar contigo. Eles devem chegar
a qualquer momento. – respondeu-lhe amavelmente o simpático senhor.
Aquilo tudo lhe causava estranheza, não
conhecia aquele homem, não sabia onde estava, quem mais estava por chegar que
também o conhecia? Hanz, mesmo tomado por uma indescritível tranqüilidade,
ficou confuso e seu interlocutor percebeu isso.
- Eu imagino o quanto você deva estar
estranhando tudo isso Hanz, mas fique tranqüilo, estando aqui você não precisa
se preocupar com nada, ao contrário, aqui você terá a chance de encontrar as
respostas que farão com quem várias de suas preocupações cheguem ao fim.
Ao invés de as palavras daquele senhor
aumentarem sua tranqüilidade elas apenas aguçavam mais ainda a curiosidade que
ele já tinha.
- Bom, eu fico feliz com isso, mas na verdade
eu vim até sua linda casa para descobrir onde estou. Nunca ouvi falar de um
lugar tão lindo... Onde estamos?
O senhor riu docemente.
- Fique calmo meu filho, não vai demorar
muito e você encontrará todas as respostas que procura. Enquanto nossos amigos
não chegam eu gostaria que desse uma lida nisso.
Hanz apanhou curioso o papel que lhe fora
oferecido e passou então a ler o que o amável senhor estava escrevendo no
momento que chegara.
Não pôde explicar o porque mas seus olhos se
encheram de lágrimas assim que ele começou a ler a bela poesia que estava
escrita no papel. Jamais havia lido nada tão profundo e verdadeiro, na verdade
não era um admirador de poesias, mas aquilo que o dono da casinha escrevera lhe
tocara profundamente.
O escritor sorriu satisfeito ao perceber a
emoção que Hanz sentia.
- Espero que tenha gostado...
- Meu Deus, eu jamais li nada assim... é
lindo. O senhor está de parabéns! Já pensou em escrever um livro? O senhor leva
jeito pra coisa. – disse Hanz enxugando suas lágrimas e lhe devolvendo o papel.
- Já, mas tudo acontece a seu tempo. Uma
coisa que devemos entender é que as coisas não acontecem sempre quando
queremos, mas sim, quando é o momento apropriado. Quando esse momento chegar eu
com certeza transformarei o que escrevo num livro, mas ainda não é chegada a
hora.
Hanz apenas concordou com a cabeça. Algo
semelhante já havia sido dito à ele, mas não se lembrava de quando e nem por
quem.
- Esses “amigos” vão demorar? É que minha
família está me esperando e eu não posso demorar muito senão eles vão ficar
preocupados.
- Como eu disse eles já devem estar chegando,
eles estão ansiosos por poder conversar com você. Fique sossegado Hanz, tempo é
o que mais temos nesse momento. – explanou ele sentando-se em uma cadeira à sua
frente.
A casa era bem cuidada e lembrava uma
daquelas casas medievais que Hanz tinha visto em filmes. A mobília e a
arquitetura não condiziam com os tempos atuais.
- Tudo bem, mas que lugar é esse? Nunca
conheci um lugar tão lindo assim...
- Compreendo que não se recorde, já se passou
muito tempo desde que você esteve aqui pela última vez, mas fico feliz que
tenha gostado, procuro cuidar do meu jardim da melhor maneira que posso.
Hanz ficou pasmo.
- Nossa, é o senhor quem cuida sozinho desse
jardim? Mas ele é muito grande, nem consegui ver o final dele. Como o senhor
consegue?
- Eu procuro fazer o melhor que posso. Às
vezes aparece alguém querendo me ajudar, mas logo eles têm que voltar aos seus
afazeres. Graças à bondade de Deus ele não me dá tanto trabalho, quando nos
dedicamos com carinho e amor à alguma coisa ela sempre é bem feita.
- O senhor tem razão, não existe coisa melhor
do que fazermos aquilo que gostamos. É uma pena que nem sempre isso seja
possível, muitas vezes fazer aquilo que gostamos não nos dá o necessário para
sobrevivermos.
- Bom, isso depende muito meu filho. Para
você, o que é necessário para sobreviver? – indagou docemente o senhor
olhando-o nos olhos.
Hanz ficou meio sem jeito com a pergunta pois
aquele senhor parecia extremamente feliz e satisfeito com a vida simples e
pacata que levava.
- Bom, acho que de dinheiro. Eu mesmo
trabalho numa área que não me agrada muito, não me traz alegria, mas é o que me
dá o dinheiro necessário pra pagar as contas e poder viver bem.
- Entendo. Eu também já passei por isso
durante um bom tempo, mas percebi que dinheiro não é tudo na vida. Claro que
ele é necessário para que possamos ter uma vida digna, mas existem muitas
coisas que o dinheiro não pode comprar. Por exemplo: eu jamais venderia meu
jardim ou minha casinha, não faria isso por dinheiro algum, mas sei que tudo
isso só está sendo confiado à mim temporariamente, chegará o dia em que eu não
mais os terei, mas nem por isso penso em vender tudo isso.
Hanz estava pensativo, analisava as palavras
daquele sábio senhor e tentava guardar as mensagens que ela trazia.
- Mas por que o senhor se dedica tanto ao seu
jardim e à sua casa se sabe que um dia tudo isso não mais será do senhor?
- Porque eu não me dedico à eles visando sua
venda, almejando ganhar dinheiro com eles, mas sim, por amor à eles. Tenho um
sentimento muito grande por tudo isso porque faço com amor, com carinho, e
dinheiro nenhum pode pagar esses meus sentimentos.
Hanz sentiu-se envergonhado por ter feito sua
última pergunta, mas a palavra é como uma pedra: uma vez lançada não mais pode
ser trazida de volta.
- Não se preocupe meu filho, existem muitas
coisas que só a vivência é capaz de nos fazer compreender. Como eu já disse: tudo
a seu tempo... – tranqüilizou-o o calmo senhor que parecia ser capaz de ler
seus pensamentos.
O rapaz sorriu-lhe sabendo de suas limitações
e ficando feliz por ele saber respeitar isso.
Nesse instante pode-se ouvir algumas vozes
que vinham de frente da casa, Hanz ajeitou-se na poltrona evidenciando sua
curiosidade.
- Parece que as outras visitas chegaram. Vou
atender à porta, só um minuto meu filho... – disse o velho indo até a porta.
Temendo ser indelicado Hanz se satisfez em
apenas ouvir as vozes daqueles que cumprimentavam o amável senhor. Estava de
costas para a porta e não queria mostrar-se indelicado e virar-se para ela.
“Tudo a seu tempo.” – pensou ele já
utilizando as palavras que ouvira a pouco.
Era estranho, Hanz não conhecia suas vozes
mas o modo como falavam lhe eram familiares. Como elas podiam conhecê-lo se ele
nem sequer reconhecia suas vozes?
Não demorou muito para que o anfitrião
encaminhasse os recém-chegados até ele, que se levantou educadamente ao
avistá-los.
Era um jovem casal: uma bela moça loira de
olhos azuis como o céu que os cobria e o rapaz era um moreno forte de olhos
claros e cabelo ralo.
Antes que ele pudesse dizer alguma coisa os
dois o abraçaram, cada um a sua vez, como se fossem amigos que estiveram longe
dele à muito tempo.
Hanz ficou feliz com a acolhida carinhosa mas
sentiu-se envergonhado por não ser capaz de reconhecer ninguém naquela sala,
embora houvesse algo de familiar em todos eles mesmo que não soubesse explicar
o quê.
Calmamente todos se sentaram nas poltronas
que formavam um círculo no centro da pequena sala, inclusive aquele que era o
dono de tão pitoresca e bem cuidada casa.
- Você não pode imaginar o quanto estamos
felizes que tenha vindo Hanz. – disse a sorridente e bela mulher.
- Realmente, é uma benção de Deus podermos
estar todos juntos mais uma vez, pensamos que isso não fosse acontecer tão
cedo. – prosseguiu o rapaz.
Hanz sentia uma inigualável atmosfera de
carinho e paz emanando daquelas pessoas, mas ainda sentia-se encabulado por não
conseguir se recordar deles.
- Fique tranqüilo Hanz, entendemos sua
situação meu filho, é chegada a hora de você entender tudo o que se passa. –
disse o sempre amável senhor.
- Que bom, eu fico envergonhado em reconhecer
que não me lembro de nenhum de vocês e ver que mesmo assim têm um grande
carinho por mim. Eu deveria me lembrar...
- Não necessariamente e não na sua situação
meu filho. Na verdade esse casal esteve contigo à bem menos tempo do que possa
imaginar, no entanto, eles possuíam uma aparência diferente da que têm agora.
Mas fique calmo Hanz, você possui o conhecimento necessário para que compreenda
tudo, só lhe peço que mantenha a mente aberta. – explicou o senhor.
Hanz ficou em silêncio aguardando que
prosseguissem com o que tinham para dizer.
- O lugar onde estamos não pode ser
encontrado em nenhum mapa que tenha ouvido falar e nem todas as pessoas têm
acesso à ele. Somente com a permissão do Pai-Maior é que é possível chegar até
aqui. No plano em que você ainda hoje se encontra infelizmente nunca lhe será
possível contemplar tanta beleza e perfeição porque o plano físico é apenas uma
cópia grosseira daqui, o plano espiritual... – prosseguiu o senhor.
Hanz arregalou os olhos e ajeitou-se na
poltrona. Mesmo com o conhecimento que possuía ele era incapaz de acreditar no
que ouvia. O anfitrião prosseguiu novamente.
- O corpo físico impede que o corpo
espiritual utilize toda sua potencialidade. A carapaça que o reveste limita
seus sentidos de forma que muita coisa lhe é inacessível...
- Então quer dizer que eu morri, ou melhor,
desencarnei? – interrompeu Hanz com espanto.
Os casal o olhou com compaixão, entendiam a
confusão que se passava em sua cabeça pois não fazia muito tempo que tinham
passado pela mesma situação.
- Não meu filho, ainda não chegou a sua hora.
Deus lhe concedeu esse encontro durante o tempo em que seu corpo físico está
descansando, ou seja, seu espírito está aproveitando que o laço que o liga ao
corpo material está mais tênue.
Um breve silêncio se fez para que Hanz
pudesse assimilar o que lhe era explicado, e graças ao conhecimento que possuía
isso não foi-lhe difícil.
- Entendo, eu já estudei isso... Durante
muito tempo me perguntei se tudo o que lia nos livros correspondia à verdade e
vejo que eles estão certos. Fico feliz por ter a prova que tanto procurava,
pensei que nunca fosse tê-la. – Hanz sorriu satisfeito.
- Vejo que agora está mais tranqüilo... –
alegrou-se o rapaz.
- Sim, estou. Não é o fato de estar em outro
plano que me deixava confuso, mas sim, o fato de não saber onde estava. Mas eu
devia já imaginar, só ao ver a perfeição do jardim e de tudo o mais que existe
aqui eu já devia saber onde estava...
- Pois bem, se compreende o que se passa
creio que já seja capaz de saber de toda a verdade. – concluiu o senhor.
Hanz confirmou com a cabeça e estava curioso
por ouvir as palavras que se seguiriam. A moça de sorriso encantador
prosseguiu.
- Estamos cientes da tristeza que reina em
seu coração e do conflito que preenche sua alma Hanz, e é por isso que pedimos
ao Criador que nos concedesse essa oportunidade. Somos muito gratos por Ele
ter-nos atendido pois acreditamos que seja injusto com você sofrer por não
conhecer a verdade. Para ser sincera contigo, o tormento pelo qual você está passando
infelizmente nos afeta aqui no novo plano em que nos encontramos...
- Entendo, sei que vocês são capazes de
enxergar a fundo o que se passa na minha alma e peço perdão por estar
transmitindo para vocês todo o sofrimento que tenho passado depois de tudo o
que me aconteceu, mas não está sendo fácil, estou triste, confuso e
profundamente desapontado. – confessou Hanz abalado pelos sentimentos que havia
esquecido ao chegar até aquele reino de paz e carinho mas que agora voltavam à
atormentá-lo.
O casal suspirou fundo, como se lutassem para
que os sentimentos que invadiam o rapaz não os afetasse.
- Procure ficar tranqüilo meu filho, é para
pôr fim à todos esses sentimentos que o Pai permitiu que aqui nos reuníssemos.
Acreditamos que, ao conhecer a verdade, você possa apaziguar seu coração. –
disse carinhosamente o senhor.
Hanz tinha lágrimas nos olhos. Estava
sofrendo não só por causa da dor que sentia mas principalmente porque agora
sabia que seu sofrimento também afetava aquelas doces pessoas.
- Me perdoem, por favor, eu jamais quis
atrapalhar a paz de vocês. Minha vida toda eu só quis fazer o bem, mas muitas
vezes parece que as pessoas se aproveitam da nossa bondade e dos sentimentos
que nos tornam mais vulneráveis para nos fazer o mal. Não entendo isso: por que
mesmo dando o melhor de nós mesmos e procurando sempre fazer o bem para as
pessoas ainda colhemos tanto sofrimento? – Hanz chorava.
- Talvez as coisas não sejam assim como você
imagina... – adiantou-se a jovem.
Hanz olhou-a aguardando por palavras que
cessassem seu sofrimento. Ela olhou para o mais velho que consentiu com a
cabeça. Ela então prosseguiu.
- Essa pessoa a quem você se doou Hanz, hoje,
mais do que nunca, sabemos que você o fez de coração. Infelizmente ela não teve
a oportunidade de lhe explicar que fez o mesmo. As coisas aconteceram de uma
maneira que não houve tempo para que a verdade fosse dita, e isso faz com que
não apenas você sofra muito, como ela também.
Hanz espantou-se ao perceber que a bela jovem
já não mais sorria e que seus olhos também estavam marejados.
- Infelizmente as atitudes de um antigo
inimigo meu e da minha companheira no plano físico fizeram com que ela agisse
de uma maneira que não tornasse possível que a verdade viesse à tona Hanz. Mas
nem sempre as coisas são como parecem ser. Graças à essa atitude minha
companheira agora está mais do que nunca engajada na realidade espírita e com
isso poderá realizar os trabalhos que à ela foram confiados quando retornou ao
plano físico, trabalhos esses que são de vital importância para seu crescimento
espiritual. – prosseguiu o rapaz.
- Cibele? – indagou Hanz perplexo.
O jovem respondeu-lhe positivamente com a
cabeça.
- E não apenas ela meu filho, mas como também
seu grande amigo Renzo agora ergue o véu que obscurecia sua visão em relação ao
espiritismo. Ele será apenas o primeiro pois sua namorada, que você conhece por
Bianca, e toda a família do casal ingressará na realidade espírita operando
assim prodígios em nome da caridade e do amor ao próximo.
Hanz já sentia que a dor em seu coração
desaparecia. Graças à tão funesto acontecimento as portas da realidade
espiritual eram abertas à todas aquelas pessoas que ele queria tão bem. Findado
o sofrimento sua mente pôde ver com melhor clareza a realidade dos fatos.
- Então você é...
- Sim Hanz, meu amigo, eu sou o Paulo, marido
de Cibele, que você conheceu. – disse sorridente o rapaz de olhos claros.
O rapaz sorriu deixando transbordar de seus
olhos a luz da alegria. Ele não sabia o que dizer...
- Obrigado meu amigo, graças aos ensinamentos
que você ministrou hoje minha amada Cibele consegue enxergar a verdade da
existência humana e também aprende a defender-se daquele que forçou-me a fazer
coisas tão terríveis. Não tenho palavras para agradecer todo o apoio que você
deu à ela no momento difícil que ela atravessou com minha partida, obrigado
Hanz, muito obrigado. Saiba que todas as palavras terríveis que eu lhe lancei
provinham de uma mente perturbada por um espírito obsessor pois desde que o
conheci sempre nutri uma profunda estima por você. Obrigado, de coração. –
disse o rapaz abaixando-se defronte à ele e segurando suas mãos.
- Não me agradeça Paulo, não precisa me
agradecer. Eu apenas quis aliviar um pouco do sofrimento que ela carregava, não
mais que isso. Fico triste por você ter se afastado dela e do Henrique, sei que
eles são muito amados por você, mas pus-me à disposição dela para qualquer tipo
de ajuda que eu possa dar. – continuou Hanz olhando-o nos olhos, sorrindo.
- Eu sei meu amigo, eu sei disso, mas é como
já foi dito: nem sempre as tragédias carregam em si somente a tristeza, muitas
vezes elas são um instrumento para que algo maior possa ser alcançado. Graças à
minha partida ela agora pode se dedicar aos trabalhos que ela tem por fazer no
plano físico, trabalhos esses que talvez não fossem realizados se eu não
partisse.
Hanz ria-se sozinho de felicidade, ele jamais
havia pensando naquela hipótese.
Paulo voltou a ocupar sua poltrona, a moça
loira e o senhor também sorriam felizes e foi nesse instante que um estalo de
lucidez veio à mente de Hanz.
- Meu Deus, então você é Tatiana? – dessa vez
seus olhos se marejaram não de sofrimento, mas de alegria.
- Sim Hanz, eu sou aquela que você amou do
fundo do seu coração. Sofro em sentir que esse sentimento tão maravilhoso
estava dando lugar ao rancor e ao ódio. Como disse, infelizmente não houve a
oportunidade de eu lhe dizer a verdade antes da minha partida.
- Mas você não me amava Tati, você estava
sendo um instrumento de Jean para os planos dele, ele mesmo me disse isso
naquela tarde terrível, você namorava ele!!
- Em parte isso é verdade Hanz. Realmente
havíamos confabulado de eu me aproximar de você para que assim pudéssemos
manipulá-lo de acordo com nossos interesses. Você possui os conhecimentos de
informática que eram necessários para que conseguíssemos o dinheiro destinado à
compra dos materiais para as ações. Ele não queria que você saísse do grupo,
não você, pois era uma peça fundamental para os planos dele. Me envergonho do que
fiz, de me aproveitar do amor que você tinha por mim de forma tão hedionda...
- Mas então o que você quer agora de mim? –
indagou rispidamente Hanz olhando-a com desprezo.
- Acalme-se filho, deixe-a prosseguir... –
solicitou o senhor.
- Mas as coisas não saíram como planejado
Hanz. Ao me aproximar de você eu percebi que era o homem da minha vida. Passei
a admirá-lo e a confiar em você. Confiei a ponto de contar-lhe meus segredos
mais profundos, a mudar meu jeito de ser, a assumir o que eu verdadeiramente
sou. Imaginei que Jean tivesse desistido do plano pois nada mais foi dito a
respeito, e eu me afastei dele pois estava com você e achando que como o grupo
deixaria de existir nosso plano também deixaria. Mas ele não suportou ser
trocado e usou o pretexto de continuar com o grupo para me ter ao lado dele e
continuar usando você como instrumento para conseguir dinheiro. Ele sabia que
se você soubesse da verdade jamais aceitaria continuar comigo e ameaçou te
contar tudo, eu fui obrigada a prosseguir com o plano...
Tatiana deixou-se dominar pela emoção e não
pôde conter as lágrimas de arrependimento que verteram compulsivamente. Paulo
colocou-lhe a mão no ombro, tentando acalmá-la, e tomou a palavra.
- Naquela fatídica tarde, quando ela
recobrou-se do golpe que recebera de Renzo e viu que Jean havia partido uma
imensa felicidade tomou conta dela pois sabia que dali por diante não teria
mais o que temer. Jean não poderia lhe dizer nada a respeito e ela poderia
continuar contigo, ser apenas sua sem estar sob o julgo de Jean. Mas
infelizmente Cibele tirou-lhe a vida sem dar-lhe tempo de dizer a verdade. Não
culpe Cibele pois ela, assim como seu, estávamos sob a influência desse nosso
antigo inimigo. Esse inimigo tentou manipular também à você Hanz, como na ocasião
de sua queda, ele queria influenciá-lo assim como fez conosco, mas por sorte
seu pai o protegia e ele não alcançou o objetivo dele, não conseguiu
influenciá-lo, mas foi capaz de fazer com que minha amada Cibele lhe infligisse
uma terrível ferida, separando-o da mulher que ama.
Hanz mal podia acreditar no que ouvia e
sentia-se envergonhado por ter feito um juízo tão equivocado da mulher que
estava agora ali à sua frente.
- Meu Deus Tati, será que algum dia você será
capaz de me perdoar pelas injúrias que disse sobre você? Por favor minha
querida, me perdoe. – agora ela ele quem se abaixava, dessa vez, diante da
mulher que entre lágrimas ainda era capaz de sorrir.
Ela afagou-lhe os cabelos como costumava
fazer no plano físico.
- Claro meu amor, eu o perdôo pois você
desconhecia a verdade. Com imenso ardor que supliquei ao Pai que permitisse
esse nosso encontro, e agora a verdade já é conhecida. Eu o amo e passei a
amá-lo mais e mais a cada dia em que pude conviver contigo. Desculpe se não
pude contar-lhe tudo isso e tenha feito-o sofrer com essa confusão toda.
- Não Tati, não se desculpe. Eu imagino seu
sofrimento ao me ver tentando a todo custo destruir o amor que sinto por você,
espero que me entenda... – disse Hanz beijando-lhe as mãos carinhosamente.
Uma harmonia sem igual tomou conta daquela
pequena e simples casa, uma harmonia ainda mais completa que a sentida por Hanz
ao chegar naquele lugar de luz.
Todos sorriam e sentiam-se incrivelmente
leves, agradecendo à Deus pela oportunidade que era-lhes concedida.
- Agora meu filho, sua amada Tatiana poderá
dedicar-se ao trabalho que sempre se dispôs à fazer em nome da recuperação dos
suicidas que se encontram em lugares tão terrível devido aos seus atos. Nada
acontece por acaso, nem mesmo a partida dela... – completou o radiante senhor
que cedera sua bela casa para aquele encontro.
- Mas diante de tudo isso eu não tenho mais
motivos para abandonar a casa de meu pai, eu não tenho mais porque sofrer e as
lembranças tristes que ela me trazia desapareceram. Eu posso continuar lá
próximo aos meus amigos. Sei que meu pai jamais aprovaria que eu vendesse a
casa dele e eu só quis fazer isso por causa das minhas lembranças tristes...
O senhor sorridente adiantou-se à sua
conclusão.
- Não meu filho, você deve sim voltar à
convivência de seus irmãos e de sua mãe, eles precisam de você. A luz que você
tem por transmitir também deve chegar até eles pois precisam dela. É sua missão
levar equilíbrio à casa de sua mãe e também, pouco a pouco, trazer-lhes à luz
da espiritualidade, você não deve fugir disso. Não se preocupe com a casa que
um dia foi minha, ela já não mais o é, assim como essa que você agora tanto
admira também não. Tudo funciona de acordo com o planejamento de Deus: aquela
casa abrigará debaixo de seu teto um casal que trabalhará de forma inigualável
em prol da casa espírita e que está chegar naquela cidade.
Hanz estava atônito diante da perfeição dos
desígnios de Deus, tudo tinha um motivo divino para acontecer, até mesmo seu
retorno para a capital. Ao pensar nisso foi que ele se deu conta de quem era
aquele bondoso senhor que ali os recebera: ele era seu pai.
- Pai... pai, é o senhor? – disse ele
aproximando-se do sorridente senhor.
- Sim meu filho. Pelo que vejo continua
distraído em relação ao meu amor por você. Tenho chamado-o assim desde que
chegou aqui e em nenhum momento se deu conta disso. – esclareceu ele
levantando-se e abrindo os braços convidando-o para um abraço.
Pai e filho unidos num enlace de amor e
respeito que à muito não acontecia e com isso as lágrimas de ambos não puderam
ser contidas.
Tatiana e Paulo também se levantaram e
abraçaram-se felizes.
- Perdoe-me meu filho se não pude lhe dar
mais do que dei quando estava contigo no plano físico. Perdoe-me, mas fiz o
melhor que pude. Mas acredite: você não é capaz de imaginar o orgulho que sinto
em ver o homem iluminado no qual se tornou...
Hanz chorava descontroladamente pois as
palavras de seu pai faziam com que se lembrasse das diversas vezes em que
atribuiu-lhe a culpa pelas dificuldades materiais pelas quais ele e sua família
passou.
- Eu sei meu pai, eu sei. Não se desculpe, eu
sei que o senhor fez o melhor. Me perdoe por tê-lo acusado tantas e tantas
vezes. Eu tive tudo de mais precioso que um filho pode receber de um pai:
carinho, educação, saúde e, sobretudo, a construção de um caráter erguido sobre
os alicerces da honestidade e do amor. Obrigado por ter me dado tudo isso,
obrigado.
Aquele abraço prosseguiu por mais alguns
instantes. Um abraço que selava o perdão, diminuía a saudade e selava o amor
entre eles.
Mas era chegada a hora do retorno ao plano
físico e Hanz devia deixar seus entes queridos.
- Fique em paz meu amigo, sempre que a Cibele
e o Henrique precisarem eu farei de tudo para ajudá-los, fique tranqüilo. –
disse ele abraçando Paulo.
- Eu sei Hanz, eu sempre confiei em você.
Abrace meu grande amigo Renzo por mim e esteja sempre que possível junto dele,
aquele desmiolado ainda vai precisar muito dos seus conselhos, nem sempre
estarei disponível para velar por ele, faça isso por mim.
- Sem dúvida Paulo, Renzo é como um irmão pra
mim. – reforçou ele sorrindo-lhe.
Em seguida foi a vez de seu pai, que
aguardava pelo abraço de despedida.
- Vá em paz meu filho, cuide de sua mãe e de
seus irmãos. Creio que não preciso dar-lhe nenhum conselho, você sabe de tudo
que precisa, vá em paz e esteja certo de que estarei sempre ao seu lado, sempre
que precisar.
- Sim pai, eu sei disso. Continue com o
trabalho tão lindo que tem aqui, espero poder vir visitá-lo nesse lugar
maravilhoso sempre que Deus permitir...
Por último estava Tatiana, mais linda do que
nunca. A personificação de todos seus desejos, que chorava de alegria por ter
esclarecido tudo e também pela partida de seu amado.
O abraço dos dois foi o mais demorado, agora
que sabiam da pureza do amor que existia entre eles era-lhes mais difícil a
separação.
- Se cuida meu amor, um dia eu estarei aqui
junto de você, eu nunca vou te esquecer, eu te amo. – disse Hanz entre soluços.
- Eu também o amo muito Hanz, sempre o amei e
agora sei disso. Você ainda tem muito por viver no plano físico, mas meu
pensamento e meu coração sempre estarão contigo, sempre...
Infelizmente o encontro entre todos eles
chegava ao fim e cada um retornaria agora à sua realidade. A saudade seria
imensa, mas a felicidade que sentiam por verem todo o sofrimento que os afligia
se findar era ainda maior.”
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