terça-feira, 26 de agosto de 2014

Capítulo XLVIII


  “Nunca tinha passado por ali antes e se perguntava como jamais tinha ouvido falar num  lugar tão bonito.
  A estrada era plana, bem cuidada e cortava um imenso campo florido que se perdia no horizonte. Não sabia como tinha chegado ali, a estrada que o levava de volta para a capital era bem diferente daquela. Hanz procurou por alguma placa de sinalização que indicasse as cidades próximas mas ao longo do caminho não havia nenhuma nem mesmo para advertir sobre o limite de velocidade a ser respeitado, o que lhe causou estranheza. Prosseguiu por mais alguns minutos e a única coisa que conseguiu ver foi uma pequena casa perdida em meio a todas aquelas flores. Curioso por saber onde estava ele pensava:
  “Poxa, deve ter alguém naquela casa que possa me dizer onde estou. Preciso descobrir que lugar é esse pra poder voltar aqui mais vezes.” – e encostou seu carro o mais próximo possível da pequena casa.
  Sentiu o ar puro e fresco que lhe preencheu os pulmões, ar esse que ele não conseguia apreciar confinado dentro do carro. Procurou por alguma trilha que o levasse até a casinha pois estava com pena de pisar sobre tão bem cuidado jardim, mas não conseguiu encontrar nenhuma.
  “É, infelizmente não vai ter jeito...” – pensou ele adentrando pelo jardim em direção à pequena casa. Durante esse relativamente longo trajeto pôde contemplar o céu de um azul incomparável, totalmente sem nuvens, e maravilhou-se também com isso.
  “Poxa, não dá pra acreditar que hoje em dia ainda existam lugares como esse, onde será que eu estou? Será que errei o caminho?” – indagou ele já quase chegando ao seu destino.
  Quando finalmente alcançou a bem cuidada casa ele sentiu a tranqüilidade que o local emanava. Suas paredes de um amarelo suave e a porta de um branco incomparável davam a entender que elas haviam sido pintadas recentemente pois estavam muito bem cuidadas.
  Procurou por algum barulho que indicasse haver vida naquele lugar, mas somente era possível ouvir o canto de alguns pássaros ao longe, a casa estava silenciosa. Hanz então resolveu bater à porta e como resposta teve uma tranqüila voz masculina pedindo-lhe que entrasse.
  O rapaz fez então o que lhe havia sido solicitado e encontrou um senhor que estava sentado de costas para a porta e que, sentado, debruçava-se sobre algo que parecia ser uma escrivaninha.
  - O senhor me desculpe se estou incomodando... – disse Hanz educadamente pois o homem parecia estar ocupado.
  - Entre rapaz, não incomoda em nada, eu já tinha praticamente terminado... – interrompeu-o o senhor virando-se.
  Hanz sabia que aquele homem era totalmente estranho para ele, sua fisionomia demonstrava isso, mas o olhar e o sorriso eram-lhe familiares.
  Um imenso carinho transbordava dos olhos daquele homem que trajava um simples, porém caprichoso, macacão semelhante ao de um jardineiro.
  - Que bom que chegou Hanz, eu estava à sua espera. – disse o senhor aproximando-se e lhe dando um carinhoso abraço.
  Como aquele homem sabia seu nome? O carinho que ele lhe demonstrava era o de quem já o conhecia muito bem mas Hanz jamais o tinha visto, ou se tinha, havia se esquecido dele. Hanz teve vontade de perguntar à ele de onde o conhecia, mas acreditou que seria indelicado de sua parte, seria constrangedor esquecer-se de alguém que tinha por ele tamanho carinho.
  - Fico feliz que tenha chegado, sente-se, logo as outras visitas estarão chegando também. – convidou-o o amável senhor indicando-lhe uma poltrona.
  - Outras visitas? Vem mais alguém aqui hoje? Quem? – Hanz não conseguiu disfarçar sua curiosidade.
  - Ora, ora, quando os outros souberam que você estaria aqui hoje eles quiseram vir para falar contigo. Eles devem chegar a qualquer momento. – respondeu-lhe amavelmente o simpático senhor.
  Aquilo tudo lhe causava estranheza, não conhecia aquele homem, não sabia onde estava, quem mais estava por chegar que também o conhecia? Hanz, mesmo tomado por uma indescritível tranqüilidade, ficou confuso e seu interlocutor percebeu isso.
  - Eu imagino o quanto você deva estar estranhando tudo isso Hanz, mas fique tranqüilo, estando aqui você não precisa se preocupar com nada, ao contrário, aqui você terá a chance de encontrar as respostas que farão com quem várias de suas preocupações cheguem ao fim.
  Ao invés de as palavras daquele senhor aumentarem sua tranqüilidade elas apenas aguçavam mais ainda a curiosidade que ele já tinha.
  - Bom, eu fico feliz com isso, mas na verdade eu vim até sua linda casa para descobrir onde estou. Nunca ouvi falar de um lugar tão lindo... Onde estamos?
  O senhor riu docemente.
  - Fique calmo meu filho, não vai demorar muito e você encontrará todas as respostas que procura. Enquanto nossos amigos não chegam eu gostaria que desse uma lida nisso.
  Hanz apanhou curioso o papel que lhe fora oferecido e passou então a ler o que o amável senhor estava escrevendo no momento que chegara.
  Não pôde explicar o porque mas seus olhos se encheram de lágrimas assim que ele começou a ler a bela poesia que estava escrita no papel. Jamais havia lido nada tão profundo e verdadeiro, na verdade não era um admirador de poesias, mas aquilo que o dono da casinha escrevera lhe tocara profundamente.
  O escritor sorriu satisfeito ao perceber a emoção que Hanz sentia.
  - Espero que tenha gostado...
  - Meu Deus, eu jamais li nada assim... é lindo. O senhor está de parabéns! Já pensou em escrever um livro? O senhor leva jeito pra coisa. – disse Hanz enxugando suas lágrimas e lhe devolvendo o papel.
  - Já, mas tudo acontece a seu tempo. Uma coisa que devemos entender é que as coisas não acontecem sempre quando queremos, mas sim, quando é o momento apropriado. Quando esse momento chegar eu com certeza transformarei o que escrevo num livro, mas ainda não é chegada a hora.
  Hanz apenas concordou com a cabeça. Algo semelhante já havia sido dito à ele, mas não se lembrava de quando e nem por quem.
  - Esses “amigos” vão demorar? É que minha família está me esperando e eu não posso demorar muito senão eles vão ficar preocupados.
  - Como eu disse eles já devem estar chegando, eles estão ansiosos por poder conversar com você. Fique sossegado Hanz, tempo é o que mais temos nesse momento. – explanou ele sentando-se em uma cadeira à sua frente.
  A casa era bem cuidada e lembrava uma daquelas casas medievais que Hanz tinha visto em filmes. A mobília e a arquitetura não condiziam com os tempos atuais.
  - Tudo bem, mas que lugar é esse? Nunca conheci um lugar tão lindo assim...
  - Compreendo que não se recorde, já se passou muito tempo desde que você esteve aqui pela última vez, mas fico feliz que tenha gostado, procuro cuidar do meu jardim da melhor maneira que posso.
  Hanz ficou pasmo.
  - Nossa, é o senhor quem cuida sozinho desse jardim? Mas ele é muito grande, nem consegui ver o final dele. Como o senhor consegue?
  - Eu procuro fazer o melhor que posso. Às vezes aparece alguém querendo me ajudar, mas logo eles têm que voltar aos seus afazeres. Graças à bondade de Deus ele não me dá tanto trabalho, quando nos dedicamos com carinho e amor à alguma coisa ela sempre é bem feita.
  - O senhor tem razão, não existe coisa melhor do que fazermos aquilo que gostamos. É uma pena que nem sempre isso seja possível, muitas vezes fazer aquilo que gostamos não nos dá o necessário para sobrevivermos.
  - Bom, isso depende muito meu filho. Para você, o que é necessário para sobreviver? – indagou docemente o senhor olhando-o nos olhos.
  Hanz ficou meio sem jeito com a pergunta pois aquele senhor parecia extremamente feliz e satisfeito com a vida simples e pacata que levava.
  - Bom, acho que de dinheiro. Eu mesmo trabalho numa área que não me agrada muito, não me traz alegria, mas é o que me dá o dinheiro necessário pra pagar as contas e poder viver bem.
  - Entendo. Eu também já passei por isso durante um bom tempo, mas percebi que dinheiro não é tudo na vida. Claro que ele é necessário para que possamos ter uma vida digna, mas existem muitas coisas que o dinheiro não pode comprar. Por exemplo: eu jamais venderia meu jardim ou minha casinha, não faria isso por dinheiro algum, mas sei que tudo isso só está sendo confiado à mim temporariamente, chegará o dia em que eu não mais os terei, mas nem por isso penso em vender tudo isso.
  Hanz estava pensativo, analisava as palavras daquele sábio senhor e tentava guardar as mensagens que ela trazia.
  - Mas por que o senhor se dedica tanto ao seu jardim e à sua casa se sabe que um dia tudo isso não mais será do senhor?
  - Porque eu não me dedico à eles visando sua venda, almejando ganhar dinheiro com eles, mas sim, por amor à eles. Tenho um sentimento muito grande por tudo isso porque faço com amor, com carinho, e dinheiro nenhum pode pagar esses meus sentimentos.
  Hanz sentiu-se envergonhado por ter feito sua última pergunta, mas a palavra é como uma pedra: uma vez lançada não mais pode ser trazida de volta.
  - Não se preocupe meu filho, existem muitas coisas que só a vivência é capaz de nos fazer compreender. Como eu já disse: tudo a seu tempo... – tranqüilizou-o o calmo senhor que parecia ser capaz de ler seus pensamentos.
  O rapaz sorriu-lhe sabendo de suas limitações e ficando feliz por ele saber respeitar isso.
  Nesse instante pode-se ouvir algumas vozes que vinham de frente da casa, Hanz ajeitou-se na poltrona evidenciando sua curiosidade.
  - Parece que as outras visitas chegaram. Vou atender à porta, só um minuto meu filho... – disse o velho indo até a porta.
  Temendo ser indelicado Hanz se satisfez em apenas ouvir as vozes daqueles que cumprimentavam o amável senhor. Estava de costas para a porta e não queria mostrar-se indelicado e virar-se para ela.
  “Tudo a seu tempo.” – pensou ele já utilizando as palavras que ouvira a pouco.
  Era estranho, Hanz não conhecia suas vozes mas o modo como falavam lhe eram familiares. Como elas podiam conhecê-lo se ele nem sequer reconhecia suas vozes?
  Não demorou muito para que o anfitrião encaminhasse os recém-chegados até ele, que se levantou educadamente ao avistá-los.
  Era um jovem casal: uma bela moça loira de olhos azuis como o céu que os cobria e o rapaz era um moreno forte de olhos claros e cabelo ralo.
  Antes que ele pudesse dizer alguma coisa os dois o abraçaram, cada um a sua vez, como se fossem amigos que estiveram longe dele à muito tempo.
  Hanz ficou feliz com a acolhida carinhosa mas sentiu-se envergonhado por não ser capaz de reconhecer ninguém naquela sala, embora houvesse algo de familiar em todos eles mesmo que não soubesse explicar o quê.
  Calmamente todos se sentaram nas poltronas que formavam um círculo no centro da pequena sala, inclusive aquele que era o dono de tão pitoresca e bem cuidada casa.
  - Você não pode imaginar o quanto estamos felizes que tenha vindo Hanz. – disse a sorridente e bela mulher.
  - Realmente, é uma benção de Deus podermos estar todos juntos mais uma vez, pensamos que isso não fosse acontecer tão cedo. – prosseguiu o rapaz.
  Hanz sentia uma inigualável atmosfera de carinho e paz emanando daquelas pessoas, mas ainda sentia-se encabulado por não conseguir se recordar deles.
  - Fique tranqüilo Hanz, entendemos sua situação meu filho, é chegada a hora de você entender tudo o que se passa. – disse o sempre amável senhor.
  - Que bom, eu fico envergonhado em reconhecer que não me lembro de nenhum de vocês e ver que mesmo assim têm um grande carinho por mim. Eu deveria me lembrar...
  - Não necessariamente e não na sua situação meu filho. Na verdade esse casal esteve contigo à bem menos tempo do que possa imaginar, no entanto, eles possuíam uma aparência diferente da que têm agora. Mas fique calmo Hanz, você possui o conhecimento necessário para que compreenda tudo, só lhe peço que mantenha a mente aberta. – explicou o senhor.
  Hanz ficou em silêncio aguardando que prosseguissem com o que tinham para dizer.
  - O lugar onde estamos não pode ser encontrado em nenhum mapa que tenha ouvido falar e nem todas as pessoas têm acesso à ele. Somente com a permissão do Pai-Maior é que é possível chegar até aqui. No plano em que você ainda hoje se encontra infelizmente nunca lhe será possível contemplar tanta beleza e perfeição porque o plano físico é apenas uma cópia grosseira daqui, o plano espiritual... – prosseguiu o senhor.
  Hanz arregalou os olhos e ajeitou-se na poltrona. Mesmo com o conhecimento que possuía ele era incapaz de acreditar no que ouvia. O anfitrião prosseguiu novamente.
  - O corpo físico impede que o corpo espiritual utilize toda sua potencialidade. A carapaça que o reveste limita seus sentidos de forma que muita coisa lhe é inacessível...
  - Então quer dizer que eu morri, ou melhor, desencarnei? – interrompeu Hanz com espanto.
  Os casal o olhou com compaixão, entendiam a confusão que se passava em sua cabeça pois não fazia muito tempo que tinham passado pela mesma situação.
  - Não meu filho, ainda não chegou a sua hora. Deus lhe concedeu esse encontro durante o tempo em que seu corpo físico está descansando, ou seja, seu espírito está aproveitando que o laço que o liga ao corpo material está mais tênue.
  Um breve silêncio se fez para que Hanz pudesse assimilar o que lhe era explicado, e graças ao conhecimento que possuía isso não foi-lhe difícil.
  - Entendo, eu já estudei isso... Durante muito tempo me perguntei se tudo o que lia nos livros correspondia à verdade e vejo que eles estão certos. Fico feliz por ter a prova que tanto procurava, pensei que nunca fosse tê-la. – Hanz sorriu satisfeito.
  - Vejo que agora está mais tranqüilo... – alegrou-se o rapaz.
  - Sim, estou. Não é o fato de estar em outro plano que me deixava confuso, mas sim, o fato de não saber onde estava. Mas eu devia já imaginar, só ao ver a perfeição do jardim e de tudo o mais que existe aqui eu já devia saber onde estava...
  - Pois bem, se compreende o que se passa creio que já seja capaz de saber de toda a verdade. – concluiu o senhor.
  Hanz confirmou com a cabeça e estava curioso por ouvir as palavras que se seguiriam. A moça de sorriso encantador prosseguiu.
  - Estamos cientes da tristeza que reina em seu coração e do conflito que preenche sua alma Hanz, e é por isso que pedimos ao Criador que nos concedesse essa oportunidade. Somos muito gratos por Ele ter-nos atendido pois acreditamos que seja injusto com você sofrer por não conhecer a verdade. Para ser sincera contigo, o tormento pelo qual você está passando infelizmente nos afeta aqui no novo plano em que nos encontramos...
  - Entendo, sei que vocês são capazes de enxergar a fundo o que se passa na minha alma e peço perdão por estar transmitindo para vocês todo o sofrimento que tenho passado depois de tudo o que me aconteceu, mas não está sendo fácil, estou triste, confuso e profundamente desapontado. – confessou Hanz abalado pelos sentimentos que havia esquecido ao chegar até aquele reino de paz e carinho mas que agora voltavam à atormentá-lo.
  O casal suspirou fundo, como se lutassem para que os sentimentos que invadiam o rapaz não os afetasse.
  - Procure ficar tranqüilo meu filho, é para pôr fim à todos esses sentimentos que o Pai permitiu que aqui nos reuníssemos. Acreditamos que, ao conhecer a verdade, você possa apaziguar seu coração. – disse carinhosamente o senhor.
  Hanz tinha lágrimas nos olhos. Estava sofrendo não só por causa da dor que sentia mas principalmente porque agora sabia que seu sofrimento também afetava aquelas doces pessoas.
  - Me perdoem, por favor, eu jamais quis atrapalhar a paz de vocês. Minha vida toda eu só quis fazer o bem, mas muitas vezes parece que as pessoas se aproveitam da nossa bondade e dos sentimentos que nos tornam mais vulneráveis para nos fazer o mal. Não entendo isso: por que mesmo dando o melhor de nós mesmos e procurando sempre fazer o bem para as pessoas ainda colhemos tanto sofrimento? – Hanz chorava.
  - Talvez as coisas não sejam assim como você imagina... – adiantou-se a jovem.
  Hanz olhou-a aguardando por palavras que cessassem seu sofrimento. Ela olhou para o mais velho que consentiu com a cabeça. Ela então prosseguiu.
  - Essa pessoa a quem você se doou Hanz, hoje, mais do que nunca, sabemos que você o fez de coração. Infelizmente ela não teve a oportunidade de lhe explicar que fez o mesmo. As coisas aconteceram de uma maneira que não houve tempo para que a verdade fosse dita, e isso faz com que não apenas você sofra muito, como ela também.
  Hanz espantou-se ao perceber que a bela jovem já não mais sorria e que seus olhos também estavam marejados.
  - Infelizmente as atitudes de um antigo inimigo meu e da minha companheira no plano físico fizeram com que ela agisse de uma maneira que não tornasse possível que a verdade viesse à tona Hanz. Mas nem sempre as coisas são como parecem ser. Graças à essa atitude minha companheira agora está mais do que nunca engajada na realidade espírita e com isso poderá realizar os trabalhos que à ela foram confiados quando retornou ao plano físico, trabalhos esses que são de vital importância para seu crescimento espiritual. – prosseguiu o rapaz.
  - Cibele? – indagou Hanz perplexo.
  O jovem respondeu-lhe positivamente com a cabeça.
  - E não apenas ela meu filho, mas como também seu grande amigo Renzo agora ergue o véu que obscurecia sua visão em relação ao espiritismo. Ele será apenas o primeiro pois sua namorada, que você conhece por Bianca, e toda a família do casal ingressará na realidade espírita operando assim prodígios em nome da caridade e do amor ao próximo.
  Hanz já sentia que a dor em seu coração desaparecia. Graças à tão funesto acontecimento as portas da realidade espiritual eram abertas à todas aquelas pessoas que ele queria tão bem. Findado o sofrimento sua mente pôde ver com melhor clareza a realidade dos fatos.
  - Então você é...
  - Sim Hanz, meu amigo, eu sou o Paulo, marido de Cibele, que você conheceu. – disse sorridente o rapaz de olhos claros.
  O rapaz sorriu deixando transbordar de seus olhos a luz da alegria. Ele não sabia o que dizer...
  - Obrigado meu amigo, graças aos ensinamentos que você ministrou hoje minha amada Cibele consegue enxergar a verdade da existência humana e também aprende a defender-se daquele que forçou-me a fazer coisas tão terríveis. Não tenho palavras para agradecer todo o apoio que você deu à ela no momento difícil que ela atravessou com minha partida, obrigado Hanz, muito obrigado. Saiba que todas as palavras terríveis que eu lhe lancei provinham de uma mente perturbada por um espírito obsessor pois desde que o conheci sempre nutri uma profunda estima por você. Obrigado, de coração. – disse o rapaz abaixando-se defronte à ele e segurando suas mãos.
  - Não me agradeça Paulo, não precisa me agradecer. Eu apenas quis aliviar um pouco do sofrimento que ela carregava, não mais que isso. Fico triste por você ter se afastado dela e do Henrique, sei que eles são muito amados por você, mas pus-me à disposição dela para qualquer tipo de ajuda que eu possa dar. – continuou Hanz olhando-o nos olhos, sorrindo.
  - Eu sei meu amigo, eu sei disso, mas é como já foi dito: nem sempre as tragédias carregam em si somente a tristeza, muitas vezes elas são um instrumento para que algo maior possa ser alcançado. Graças à minha partida ela agora pode se dedicar aos trabalhos que ela tem por fazer no plano físico, trabalhos esses que talvez não fossem realizados se eu não partisse.
  Hanz ria-se sozinho de felicidade, ele jamais havia pensando naquela hipótese.
  Paulo voltou a ocupar sua poltrona, a moça loira e o senhor também sorriam felizes e foi nesse instante que um estalo de lucidez veio à mente de Hanz.
  - Meu Deus, então você é Tatiana? – dessa vez seus olhos se marejaram não de sofrimento, mas de alegria.
  - Sim Hanz, eu sou aquela que você amou do fundo do seu coração. Sofro em sentir que esse sentimento tão maravilhoso estava dando lugar ao rancor e ao ódio. Como disse, infelizmente não houve a oportunidade de eu lhe dizer a verdade antes da minha partida.
  - Mas você não me amava Tati, você estava sendo um instrumento de Jean para os planos dele, ele mesmo me disse isso naquela tarde terrível, você namorava ele!!
  - Em parte isso é verdade Hanz. Realmente havíamos confabulado de eu me aproximar de você para que assim pudéssemos manipulá-lo de acordo com nossos interesses. Você possui os conhecimentos de informática que eram necessários para que conseguíssemos o dinheiro destinado à compra dos materiais para as ações. Ele não queria que você saísse do grupo, não você, pois era uma peça fundamental para os planos dele. Me envergonho do que fiz, de me aproveitar do amor que você tinha por mim de forma tão hedionda...
  - Mas então o que você quer agora de mim? – indagou rispidamente Hanz olhando-a com desprezo.
  - Acalme-se filho, deixe-a prosseguir... – solicitou o senhor.
  - Mas as coisas não saíram como planejado Hanz. Ao me aproximar de você eu percebi que era o homem da minha vida. Passei a admirá-lo e a confiar em você. Confiei a ponto de contar-lhe meus segredos mais profundos, a mudar meu jeito de ser, a assumir o que eu verdadeiramente sou. Imaginei que Jean tivesse desistido do plano pois nada mais foi dito a respeito, e eu me afastei dele pois estava com você e achando que como o grupo deixaria de existir nosso plano também deixaria. Mas ele não suportou ser trocado e usou o pretexto de continuar com o grupo para me ter ao lado dele e continuar usando você como instrumento para conseguir dinheiro. Ele sabia que se você soubesse da verdade jamais aceitaria continuar comigo e ameaçou te contar tudo, eu fui obrigada a prosseguir com o plano...
  Tatiana deixou-se dominar pela emoção e não pôde conter as lágrimas de arrependimento que verteram compulsivamente. Paulo colocou-lhe a mão no ombro, tentando acalmá-la, e tomou a palavra.
  - Naquela fatídica tarde, quando ela recobrou-se do golpe que recebera de Renzo e viu que Jean havia partido uma imensa felicidade tomou conta dela pois sabia que dali por diante não teria mais o que temer. Jean não poderia lhe dizer nada a respeito e ela poderia continuar contigo, ser apenas sua sem estar sob o julgo de Jean. Mas infelizmente Cibele tirou-lhe a vida sem dar-lhe tempo de dizer a verdade. Não culpe Cibele pois ela, assim como seu, estávamos sob a influência desse nosso antigo inimigo. Esse inimigo tentou manipular também à você Hanz, como na ocasião de sua queda, ele queria influenciá-lo assim como fez conosco, mas por sorte seu pai o protegia e ele não alcançou o objetivo dele, não conseguiu influenciá-lo, mas foi capaz de fazer com que minha amada Cibele lhe infligisse uma terrível ferida, separando-o da mulher que ama.
  Hanz mal podia acreditar no que ouvia e sentia-se envergonhado por ter feito um juízo tão equivocado da mulher que estava agora ali à sua frente.
  - Meu Deus Tati, será que algum dia você será capaz de me perdoar pelas injúrias que disse sobre você? Por favor minha querida, me perdoe. – agora ela ele quem se abaixava, dessa vez, diante da mulher que entre lágrimas ainda era capaz de sorrir.
  Ela afagou-lhe os cabelos como costumava fazer no plano físico.
  - Claro meu amor, eu o perdôo pois você desconhecia a verdade. Com imenso ardor que supliquei ao Pai que permitisse esse nosso encontro, e agora a verdade já é conhecida. Eu o amo e passei a amá-lo mais e mais a cada dia em que pude conviver contigo. Desculpe se não pude contar-lhe tudo isso e tenha feito-o sofrer com essa confusão toda.
  - Não Tati, não se desculpe. Eu imagino seu sofrimento ao me ver tentando a todo custo destruir o amor que sinto por você, espero que me entenda... – disse Hanz beijando-lhe as mãos carinhosamente.
  Uma harmonia sem igual tomou conta daquela pequena e simples casa, uma harmonia ainda mais completa que a sentida por Hanz ao chegar naquele lugar de luz.
  Todos sorriam e sentiam-se incrivelmente leves, agradecendo à Deus pela oportunidade que era-lhes concedida.
  - Agora meu filho, sua amada Tatiana poderá dedicar-se ao trabalho que sempre se dispôs à fazer em nome da recuperação dos suicidas que se encontram em lugares tão terrível devido aos seus atos. Nada acontece por acaso, nem mesmo a partida dela... – completou o radiante senhor que cedera sua bela casa para aquele encontro.
  - Mas diante de tudo isso eu não tenho mais motivos para abandonar a casa de meu pai, eu não tenho mais porque sofrer e as lembranças tristes que ela me trazia desapareceram. Eu posso continuar lá próximo aos meus amigos. Sei que meu pai jamais aprovaria que eu vendesse a casa dele e eu só quis fazer isso por causa das minhas lembranças tristes...
  O senhor sorridente adiantou-se à sua conclusão.
  - Não meu filho, você deve sim voltar à convivência de seus irmãos e de sua mãe, eles precisam de você. A luz que você tem por transmitir também deve chegar até eles pois precisam dela. É sua missão levar equilíbrio à casa de sua mãe e também, pouco a pouco, trazer-lhes à luz da espiritualidade, você não deve fugir disso. Não se preocupe com a casa que um dia foi minha, ela já não mais o é, assim como essa que você agora tanto admira também não. Tudo funciona de acordo com o planejamento de Deus: aquela casa abrigará debaixo de seu teto um casal que trabalhará de forma inigualável em prol da casa espírita e que está chegar naquela cidade.
  Hanz estava atônito diante da perfeição dos desígnios de Deus, tudo tinha um motivo divino para acontecer, até mesmo seu retorno para a capital. Ao pensar nisso foi que ele se deu conta de quem era aquele bondoso senhor que ali os recebera: ele era seu pai.
  - Pai... pai, é o senhor? – disse ele aproximando-se do sorridente senhor.
  - Sim meu filho. Pelo que vejo continua distraído em relação ao meu amor por você. Tenho chamado-o assim desde que chegou aqui e em nenhum momento se deu conta disso. – esclareceu ele levantando-se e abrindo os braços convidando-o para um abraço.
  Pai e filho unidos num enlace de amor e respeito que à muito não acontecia e com isso as lágrimas de ambos não puderam ser contidas.
  Tatiana e Paulo também se levantaram e abraçaram-se felizes.
  - Perdoe-me meu filho se não pude lhe dar mais do que dei quando estava contigo no plano físico. Perdoe-me, mas fiz o melhor que pude. Mas acredite: você não é capaz de imaginar o orgulho que sinto em ver o homem iluminado no qual se tornou...
  Hanz chorava descontroladamente pois as palavras de seu pai faziam com que se lembrasse das diversas vezes em que atribuiu-lhe a culpa pelas dificuldades materiais pelas quais ele e sua família passou.
  - Eu sei meu pai, eu sei. Não se desculpe, eu sei que o senhor fez o melhor. Me perdoe por tê-lo acusado tantas e tantas vezes. Eu tive tudo de mais precioso que um filho pode receber de um pai: carinho, educação, saúde e, sobretudo, a construção de um caráter erguido sobre os alicerces da honestidade e do amor. Obrigado por ter me dado tudo isso, obrigado.
  Aquele abraço prosseguiu por mais alguns instantes. Um abraço que selava o perdão, diminuía a saudade e selava o amor entre eles. 
  Mas era chegada a hora do retorno ao plano físico e Hanz devia deixar seus entes queridos.
  - Fique em paz meu amigo, sempre que a Cibele e o Henrique precisarem eu farei de tudo para ajudá-los, fique tranqüilo. – disse ele abraçando Paulo.
  - Eu sei Hanz, eu sempre confiei em você. Abrace meu grande amigo Renzo por mim e esteja sempre que possível junto dele, aquele desmiolado ainda vai precisar muito dos seus conselhos, nem sempre estarei disponível para velar por ele, faça isso por mim.
  - Sem dúvida Paulo, Renzo é como um irmão pra mim. – reforçou ele sorrindo-lhe.
  Em seguida foi a vez de seu pai, que aguardava pelo abraço de despedida.
  - Vá em paz meu filho, cuide de sua mãe e de seus irmãos. Creio que não preciso dar-lhe nenhum conselho, você sabe de tudo que precisa, vá em paz e esteja certo de que estarei sempre ao seu lado, sempre que precisar.
  - Sim pai, eu sei disso. Continue com o trabalho tão lindo que tem aqui, espero poder vir visitá-lo nesse lugar maravilhoso sempre que Deus permitir...
  Por último estava Tatiana, mais linda do que nunca. A personificação de todos seus desejos, que chorava de alegria por ter esclarecido tudo e também pela partida de seu amado.
  O abraço dos dois foi o mais demorado, agora que sabiam da pureza do amor que existia entre eles era-lhes mais difícil a separação.
  - Se cuida meu amor, um dia eu estarei aqui junto de você, eu nunca vou te esquecer, eu te amo. – disse Hanz entre soluços.
  - Eu também o amo muito Hanz, sempre o amei e agora sei disso. Você ainda tem muito por viver no plano físico, mas meu pensamento e meu coração sempre estarão contigo, sempre...
  Infelizmente o encontro entre todos eles chegava ao fim e cada um retornaria agora à sua realidade. A saudade seria imensa, mas a felicidade que sentiam por verem todo o sofrimento que os afligia se findar era ainda maior.”

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