Todos estavam
reunidos naquela noite, mas o sentimento de realização de outrora já não era
mais encontrado entre eles, ao contrário, uma terrível ira reinava.
- Eu
não me conformo com isso meu, não me conformo!!! – dizia Hanz visivelmente
frustrado.
-
Fiu, o que não dá pra se conformar é em como o povo é capaz de acreditar nas
coisas que a imprensa inventa, como acreditam nessas histórias absurdas que
eles inventam para encobrir o óbvio!!!! – manifestava-se Renzo.
-
Olha gente, é triste dizer isso mas às vezes sou obrigado a achar que o povo
merece o governo que tem, merece o tipo de vida que leva... o povo ou é
inocente ou é muito burro!!!! – inconformava-se Tatiana.
As
exclamações indicavam que algo não corria conforme o planejado e a revolta com
aquela situação estava presente em todo o grupo, sem exceção.
A
revolta devia-se a como a imprensa noticiara as ações da noite anterior, ela
declara que as explosões haviam sido provocadas por um problema na tubulação de
gás ignorando por completo o e-mail enviado por Hanz.
Era
óbvio que muitos estranharam o fato, a desculpa pouco convencia, mas que
explicação podia haver para a série de acontecimentos? Na falta de algo mais
lógico e convincente a população acreditava na versão apresentada.
Mas a
verdade não era desconhecida, as autoridades e a imprensa conheciam a verdade
dos acontecimentos, e pelo menos esses últimos, tão comprometidos com a verdade
e a transparência, deveriam expor a verdade, e era isso o que mais revoltava o
grupo de amigos.
- Eu
pergunto pra vocês: quantos outros acontecimentos semelhantes não foram
encobertos até hoje? Essa maldita imprensa que esbraveja sua imparcialidade e
transparência acaba de nos dar a mais concreta prova do quanto ela é
manipuladora e mentirosa!!! – relata Cibele.
-
Isso é uma piada, isso sim!!! Lembram do caso de Varginha? Vocês acreditaram
naquelas histórias descabidas que foram atribuídas àquela sucessão de fatos?
Mais do que nunca vejo hoje que a população é enganada descaradamente, a
imprensa é manipulada pelo governo e só deixa de fazê-lo quando é em seu
próprio benefício, caso contrário plantam histórias absurdas para encobrir a
verdade. – prossegue Paulo, visivelmente transtornado.
Jean
mal falava, praticamente mudo, seu semblante denunciava a ira que queimava
dentro de si, assim como a quantidade de cigarros que já havia fumado.
- Mas
isso não é privilégio do nosso país, o problema é mundial, por mais democrata
que seja a nação quando o assunto envolve uma questão de segurança nacional as
informações levadas à público nunca são legítimas. – argumenta Tatiana.
Um
silêncio angustiante fez-se presente na sala. Era como se todo o risco que
correram na última madrugada tivesse sido em vão, mas agora, mais do que antes,
o grupo estava disposto a lutar por sua causa.
- Na
próxima ocasião enviarei os e-mails também para pessoas comuns, inúmeras, vou
arrumar vários endereços, não enviarei só para o governo e imprensa, quero ver
a verdade ser encoberta... – planejava Hanz.
-
Erramos em confiar na maldita imprensa, erramos feio. Mas como podíamos imaginar
que ela se calaria? – lamentou Jean.
- E
caso a imprensa tente esconder a verdade a revolta do povo será também contra
ela, que sabendo da verdade, questionará a imparcialidade e transparência que
ela sempre alegou ter. O tiro sairá pela culatra, a própria imprensa será
desacreditada pelo povo. Eles podem tentar esconder dessa vez, mas não poderão
esconder sempre. – ressaltou Cibele.
- O
plano será mais abrangente ainda, duvido que o povo não fique do nosso lado,
eles passarão a confiar somente na gente, a imprensa e o governo serão postos
em xeque. Eles mesmos estão nos dando armas, são umas bestas. Hanz, inclua isso
no próximo e-mail, dê uma lida e veja o que acha. – disse Jean entregando-lhe
um papel.
Todos
ficaram curiosos, Hanz leu em voz alta.
<<
MENTIRAS DESAGRADAM A NÓS E À TODA A NAÇÃO DO PAÍS. QUEM ESTÁ CONTRA A VERDADE
É TAMBÉM CONTRÁRIO AOS INTERESSES DO POVO E AOS NOSSOS INTERESSES. QUE NOSSA
ATITUDE MOSTRE QUE NÃO ESTAMOS BRINCANDO E ISSO É SOMENTE O INÍCIO. LEVEM AO
CONHECIMENTO COLETIVO NOSSA PRIMEIRA DECLARAÇÃO OU SOFRERÃO AS CONSEQÜÊNCIAS.
>>
Ao
término da leitura todos entreolharam-se.
-
Envie essa mensagem daqui a pouco Hanz, atacarei a emissora de rádio dessa
emissorazinha nojenta que engana o povo, a ocorrência se dará agora à uma da
manhã. – continuou friamente Jean.
A
idéia pareceu não agradar os demais.
- Não
meu, pode parar com isso, ninguém vai fazer nada. A cidade toda tá entupida de
polícia por todos os lados, como você acha que dá pra fazer alguma coisa assim?
Esqueça isso meu, é loucura. As coisas não podem ser feitas assim. – Hanz fica
de pé para devolver-lhe o papel.
- Vai
me desculpar cara, mas a decisão não pertence somente à você. O grupo decide,
não temos líder aqui, você mesmo disse isso. Vamos fazer uma votação.
Hanz
fica irritado com a atitude, pois apesar de jamais ter declarado isso,
considerava-se como líder do grupo, nunca tivera decisão alguma posta em cheque
daquela maneira.
Uma
coisa realmente era verdade, após os ataques da madrugada anterior a cidade
havia sido tomada por policiais. Batalhões de cidades próximas haviam sido
deslocadas para lá na tentativa de encontrar os responsáveis pelas agressões.
- Não
é questão de ser ou não líder Jean, é questão de que as ações devem ser bem
calculadas para que não seja colocada em jogo a credibilidade e principalmente
a segurança do grupo. Não é prudente agir assim por impulso, tem polícia por
todos os lados, você sabe muito bem disso. Como poderá fazer alguma coisa?
-
Concordo com você, mas quem poderá imaginar que no dia seguinte aos ataques
possa ocorrer um outro em seguida? Estaremos novamente pegando-os de surpresa,
eles estão totalmente desprevenidos, vai por mim cara, eu sei o que estou
falando.
-
Diga o que quiser meu, eu acho arriscado e não vale a pena fazer isso agora
meu. Mesmo que não estejam esperando, mas tem polícia patrulhando a cidade
toda, não tem como.
Os
demais apenas assistem à discussão, até que Paulo opina.
-
Olha, eu concordo com o ataque, se não fizermos isso o ataque de ontem terá
sido em vão. E é como o Jean disse, ninguém imagina que um novo ataque aconteça
hoje. Eu apoio ele, se ele diz que consegue, vamos dar crédito à ele.
- É
Hanz, se somos realmente radicais nossas atitudes também devem ser. A imprensa
está brincando com a gente, devem achar que somos um bando de moleques sem ter
o que fazer. Ou mostramos pra eles que estamos falando sério, ou seremos
desacreditados. Vamos mostrar que se não formos ouvidos os ataques se tornarão
mais e mais freqüentes, mesmo com a presença da polícia reforçada na cidade.
Assim é ainda melhor pois mostramos que não nos intimidamos com a presença
deles na cidade. Eu também apoio. – decide Cibele.
Hanz
joga-se pesadamente na poltrona ao perceber-se vencido na idéia de abortar
aquela ação de Jean.
- Não
me leva a mal não fiote, mas eu concordo com eles também. Todo mundo tem medo
de ser pego, não é só você. Mas assino embaixo do que a Cibele disse. Sei que
você está puto porque está sendo contrariado, mas todas as ações do grupo devem
ser decididas pelo grupo fiote, e não apenas por você. Se o cara diz que dá pra
fazer, então ele faz oras. Será o pescoço dele que estará em jogo. – opina
Renzo sabendo que está desagradando o amigo.
-
Também estou de acordo, se for necessária uma ação de cobertura, o que eu acho
que será, podem contar comigo. Eu confio no Jean,e podem estar certos que se alguma coisa der
errado ninguém jamais saberá da existência do grupo. Serão apenas nossas
cabeças que estarão em risco, como disse o Renzo. – reforça Tatiana.
Jean
já sabia que sua idéia havia sido aprovada mas na tentativa de minimizar
qualquer problema dentro do grupo ele ainda argumenta com Hanz.
-
Olha, eu sei que você só pensa na
segurança do grupo rapaz, mas pensa bem comigo, o que a Cibele disse é verdade,
e outra, o risco é bem menor do que você imagina. Eu não seria um louco de me
expor se considerasse uma ação como essa arriscada e não é por eu ser
ex-militar e conhecer táticas de guerra, basta raciocinar comigo: ninguém levou
à sério o que fizemos, a verdade nem veio à público, ou mostramos do que somos
capazes ou é melhor abandonar a idéia cara. Vou agir porque tenho plena certeza
de que é seguro, ninguém espera um novo ataque pra hoje, pegaremos eles de surpresa
mais uma vez. A polícia provavelmente está vigiando prédios públicos, nossos
alvos agora estão totalmente fora de perspectiva, dificilmente a vigilância
terá sido reforçada. Se eu perceber que realmente não dá, eu volto pra trás e
desisto, é simples. Mas tenho certeza de que estou com a razão.
- Ok,
isso eu concordo, mas quem garante que com um novo ataque hoje eles cederão às
nossas reivindicações? E se também não for em vão?
- Não
dá pra garantir isso, mas é a única forma de forçá-los, já que fizemos um, que
eu faça mais esse, o que temos a perder? Ou vai ou racha... – prossegue Jean
acendendo mais um cigarro.
Hanz
pensa por um breve momento e acaba aceitando a decisão.
-
Tudo bem então, faça como acha melhor, quem quiser participar pode ficar a
vontade, mas jamais esqueçam-se da primeira regra nos ataques: caso alguém seja
pego, jamais diga nada sobre os demais membros. Estou confiando no que a
Tatiana disse, ficarei despreocupado.
Todos
fazem sinal positivo com a cabeça embora alguns duvidassem de que o silêncio
fosse possível no caso de algum tipo de tortura, mas mesmo assim concordaram.
- Tá
certo então Hanz. Olha, eu e Jean já tínhamos algo combinado para um tipo de
ação como essa, só não imaginávamos que fôssemos empregá-la agora, mas acho que
tá valendo né Jean? – fala Tatiana que obtém um sinal de positivo do amigo.
- E
podemos pelo menos saber que plano é esse? – indaga Renzo.
-
Tatiana atacará a central de distribuição de energia no centro da cidade mas
antes eu atacarei a tal emissora de rádio, tudo com um intervalo de não mais
que cinco minutos, como fizemos essa madrugada. Meu ataque se dará à uma hora e
Hanz tem que enviar os e-mails pouco antes disso.
-
Tudo bem, pode deixar, isso eu posso fazer sem problemas.
Todos
parecem aceitar o plano embora Hanz demonstrasse uma certa displicência em
relação ao exposto.
Cibele
informa ter que ir embora pois ainda tem que, juntamente com Paulo, buscar o
filho na casa de sua mãe.
Plano
concluído, todos resolvem ir embora, com exceção de Renzo, que fica mais um
pouco pra conversa com Hanz.
-
Será que ele tá comendo fiu?
- Hã?
– Hanz está distante.
- A
Tatiana fiote, será que ela tá saindo com o milico?
- Sei
lá, talvez sejam apenas amigos, mas também, o que importa isso? Nem estava
pensando nisso meu.
-
Hum... sei lá fiu. Os dois já se conheciam e ninguém sabe de onde, vivem
andando juntos, combinam planos juntos, pra mim aí tem sexo sim, com certeza.
Os
dois vão até o fundo do quintal soltar Brutus.
-
Problema deles meu, desde que não deixem isso interferir nas ações do grupo,
façam o que quiserem. O que nós temos com isso?
Mesmo
brincando com Brutus, Renzo não cessa suas observações maliciosas.
- Ela
é bem jeitosa fiu, você viu? Tem uns peitos legais, ela é meio doidinha, deve
mandar bem, muito interessante isso heim...
-
Meu... você é meio doido né? Estamos metidos num esquema sério pra caramba e
você pensando nisso? E sua namorada, esqueceu dela é?
-
Porra, tô falando pra você cara, você quem deveria estar interessado, você que
é o solteirão aqui. Sei lá, nem se interessa em dar uns pegas, só pra tirar um
lazer e tal? Aposto que pra ela isso não seria nada de mais, você que tá
vacilando fiote.
- Tá,
tá, ela é gostosa sim, mas não é com isso que eu tô preocupado agora meu, ainda
tenho que fazer minha parte hoje esqueceu? Depois eu penso nisso.
- O
estranho é que você nunca se preocupa com esses lances fiu, você é meio
assexuado mesmo, tem certeza que você possui hormônios masculinos fiote? –
brinca Renzo com o amigo, que visivelmente está nervoso.
-
Olha meu, nem vou te responder isso. Agora, na boa, deixa eu fazer minhas
coisas, sábado aparece aqui pra reunião e a gente troca idéia pode ser? Não tô
com cabeça pra esses papo hoje não, me desculpa.
Os
dois vão até o portão acompanhados por Brutus, que fica pulando sobre o
grandalhão.
- Tá
certo fiu, qualquer coisa me liga esses dias, sabadão eu tô aqui. Mas fica
sossegado, não vai dar nada errado não, o cara sabe o que faz.
Hanz
fica acompanhando o carro do amigo virar a esquina, no fundo gostaria de ter o
mesmo astral que ele, mas a confrontação à sua decisão realmente não o agradara
em nada.
Sabia
que não era líder do grupo mas não esperava que todos ficassem contra ele
daquela forma, e o que era pior, apoiassem Jean que tinha um maior conhecimento
militar e possuía os contatos necessários para a aquisição de armamentos. No
caso de haver a necessidade da escolha de um líder para o grupo com certeza ele
era o candidato mais apto.
Mas
tudo corria bem, não havia necessidade da escolha de um líder e, além do mais,
em que lhe interessava ser líder do grupo?
Estaria
Tatiana envolvida com Jean? Esse pensamento sim o chateou.
Mas
em que sentido aquilo o atingia? Se os dois formavam um casal não havia
problema nisso pois Cibele e Paulo também formavam e esse fato em nada
influenciava suas atitudes dentro do grupo, qual o problema afinal?
Por
um instante, enquanto ligava o computador, pensou em Tatiana de uma forma diferente
e percebeu que o amigo estava certo: ela realmente era linda.
Não
era o tipo de garota com que ele pensasse em se casar, seu modelo de garota era
outro, mas ela era atraente... andava de moto, gostava de rock (assim como
ele), possuía feminilidade, era sensual, possuía um rosto de adolescente frágil
e desprotegida que escondia uma certa agressividade de motoqueira rebelde.
Tatiana
era original, esse era o termo correto.
Mas
por que pensava agora nisso? Jamais vira a garota com o olhar do desejo,
afinal, nem sequer vira-a muitas vezes. E de que adiantava pensar nela de outra
forma sem ser como mais um membro do grupo caso ela realmente estivesse
envolvida com Jean? Era perda de tempo.
O
melhor a fazer era concentra-se em sua tarefa, conseguir os endereços de
e-mail, fazer sua parte da melhor maneira possível e rezar para que os amigos
se saíssem bem em suas missões, principalmente Tatiana.
Ele
em certos momentos surpreendia-se olhando-a de uma maneira diferente, mas
quando caia em si percebia que ela não fazia seu gênero em nada.
Roqueira,
motoqueira, falando gírias, largadona... ele jamais interessara-se por garotas
daquele estilo, mas estranhamente ela exercia sobre ele algum tipo de atração.
Talvez
fosse seu gosto que estivesse se modificando com o passar dos anos, ou talvez
ela realmente fosse uma predadora sexual que utilizava-se de sua sedução fatal
para enfeitiçar suas vítimas, ou então talvez não fosse nada mais do que um
trabalho de macumba...
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