As pesadas
nuvens que se juntavam indicavam que a tarde daquela quinta-feira seria
bastante chuvosa e essa perspectiva fazia com que as pessoas se apressassem em
seus afazeres.
Na
movimentada rua do centro da cidade encontramos Hanz subindo apressadamente uma
rua em busca de seu carro.
É
horário de almoço e o rapaz decidira comer em casa embora tivesse que
rapidamente passar no supermercado para comprar alguma coisa, estava enjoado da
comida dos restaurantes e lanchonetes nos quais almoçava normalmente.
Até
então a semana transcorrera normalmente, sem surpresas, mas os planos de Hanz
não seriam respeitados, de certa forma, para sua felicidade.
Ele
já avistara seu carro logo à frente mas algo desviara sua atenção.
-
Nossa, onde o bonitão vai com tanta pressa?
A voz
que vinha detrás dele o surpreendera e, ao virar-se, deparou com Tatiana. A
surpresa aumentou ainda mais ao vê-la em traje social, não apenas por ser algo
inédito para ele, mas por ela estar ainda mais bela.
-
Tatiana? Que surpresa você por aqui. É você mesma ou sua irmã gêmea heim? –
cumprimentou ele beijando-lhe o rosto e sentindo seu doce perfume.
-
Engraçadinho você heim... Mas por que tanta pressa? É por causa da chuva que
está para chegar ou alguma emergência?
- Um
pouco pela chuva, você sabe o inferno que fica o trânsito quando chove, mas a
verdade é porque estou em horário de almoço e ainda tenho que passar no
supermercado antes de ir em casa. Você sabe, o tempo é curto.
-
Hum... já vai comer besteira de novo é? Menino, você tem que comer direito
senão vai acabar ficando doente ainda.
- Que
nada, eu tô acostumado, mas se você tiver alguma sugestão melhor pro almoço eu
fico feliz. – a frase saiu sem que ele se desse conta.
-
Bom, eu estou indo almoçar num restaurante aqui perto, self-service, a comida é
boa e o preço é bem em conta, que tal?
Ainda
meio abobalhado com a proposta que tinha feito à bela garota Hanz demorou um
instante para responder, mas percebeu que aquela era uma ótima oportunidade de
poder conversar a sós com ela.
“Renzo
filho da mãe, você lê mentes infeliz?” – pensou ele antes de responder.
-
Parece legal, me poupa a correria. Mas seu namorado não se importa de eu te
acompanhar?
- É,
talvez ele se incomodasse mesmo... caso eu tivesse um. Deixa de ser bobo Hanz,
vamos logo antes que comece a chover.
Não
havia notícia naquele momento que fosse capaz de deixá-lo mais feliz.
E lá
se foram os dois almoçar.
Tatiana
mostrava-se uma companhia bastante agradável, deixava transparecer uma pessoa
bem diferente daquela que freqüentava as reuniões do grupo. As roupas mais
“normais” que trajava escondiam suas tatuagens de forma que eliminavam a
aparência radical de costume.
A
chuva ainda não tinha se iniciado mas para tristeza de Hanz o almoço terminara
muito antes do que ele gostaria devido ao horário de almoço da garota ser menor
que o dele. Mesmo assim fora o suficiente para que descobrisse que ela estava
realmente sozinha e que a companhia dela o agradara muito, o que permitiria que
o acontecimento se repetisse mais vezes já que ele costumava almoçar sozinho.
Tudo
isso era uma perigosa combinação para um coração solitário.
Mas como nem tudo são flores, Tatiana
deixara-o a par de um fato que muito o intrigara, principalmente por também
tê-la preocupado, velha amiga do personagem em questão: Paulo, o Dj Paulo
Preto.
Em
meio a diversos assuntos que conversaram, ela contou-lhe que no domingo
anterior Paulo dera à sua esposa como desculpa por seu sumiço e por ter chegado
tarde em casa o fato de ter ido pesar.
Era
mais que evidente que tratava-se de uma mentira, mas isso seria um mero
problema conjugal não fosse o sexto sentido latente que fazia com que Hanz
ficasse demasiadamente desconfiado do fato. Não sabia por que, mas havia algo
estranho no ar.
Permaneceu
no restaurante mesmo após a partida da garota, serviu-se novamente, e decidiu
deixar para depois a preocupação com Paulo para dedicar-se àqueles momentos de
tranqüilidade onde podia pensar um pouco na garota que realmente mexia com ele.
Inútil
negar que Tatiana o atraía, mas essa questão não era assim tão simples. Não
tratava-se somente da relutância do rapaz em iniciar um relacionamento naquele
momento, mas também do fato dela não costumar se vestir de uma maneira mais
“normal” fora do horário de trabalho.
Sim,
o fato de ela possuir tatuagens, usar um palavreado pouco convencional e
vestir-se de uma maneira mais rebelde o incomodavam e muito, mas mesmo assim
ela exercia sobre ele uma força diferente.
Nas
poucas vezes em que ele se sujeitou a trocar olhares com ela pôde sentir uma
estranha sensação no estômago, como um calafrio, um arrepio, algo que jamais
havia sentido anteriormente.
Hanz
não fazia a menor idéia de como agir diante da situação e nem de como aquilo
terminaria.
Enfim
chegara o sábado, a semana terminava sem maiores novidades.
Hanz
já estava com seu equipamento para a próxima ação desde a noite anterior quando
Jean viera-lhe entregar, e fora eventuais telefonemas de Renzo, não havia tido
nenhum contato com os demais amigos.
Paulo
que não escondia de ninguém estar chateado com os demais membros do grupo não
dera sinal de vida.
As
atitudes incomuns que o companheiro de Cibele realizava ultimamente
incomodavam-no, mas ainda não tivera a oportunidade de conversa sobre o assunto
com ninguém após saber do acontecido pela boca de Tatiana.
Em
seu íntimo temia alguma atitude infeliz causada pelos sentimentos do rapaz.
Fazia-se necessário que ele conversasse a respeito disso com alguém que o
conhecesse mais a fundo para que tivesse noção do que ele era capaz de fazer
devido à sua revolta.
Poderia
telefonar para Renzo e falar com ele, já que ele e Paulo trabalhavam juntos,
mas o amigo havia ido com a namorada em uma festa de aniversário.
Tentava
distrair-se em seu computador mas alguma coisa dizia para que ficasse mais
alerta com relação à Paulo.
Poderia
ligar em sua casa e falar com Cibele, mas certamente ele estaria próximo à ela
e a conversa não seria possível. Não tinha o que fazer e o jeito seria aguardar
o dia seguinte até poder falar com o amigo atleta.
Mas o
destino adora mostrar-nos o inesperado e Hanz teria a oportunidade de sanar
suas dúvidas bem antes do que imaginava.
Eram
umas vinte horas, Hanz estava entretido com o programa de bate-papo pela
internet onde costumava passar horas, quando mesmo em meio aos acordes da
música alta que ouvia ele detectou o toque de sua campainha e os conseqüentes
latidos de Brutus, que sempre era o primeiro a atender as visitas.
-
Droga, não se tem sossego!! Já avisei o Renzo pra não aparecer aqui tarde da noite
porque eu sempre estou ocupado a essa hora!! – era visível que a inesperada
visita em nada o agradara. Gostava de ficar esquecido em seu mundo, saboreando
os afazeres que planejava e qualquer fato que modificasse seus planos o
incomodava.
Diminuiu
o volume da música e , irritado, encaminhou-se para identificar a inesperada
visita sem fazer idéia do quanto seu humor se modificaria.
-
Poxa, pensei que não ia atender. Mas eu até entenderia porque é difícil ouvir a
campainha com música alta. Aliás, você tem um gosto musical muito bom.
Calça
de couro, camiseta regata preta, capacete na mão... difícil saber de que forma
ela ficava mais atraente e Hanz, boquiaberto e sem jeito, deu a ordem para
Brutus ficar deitado assim Tatiana poderia entrar sem ter que se desviar dos
pulos do animal sobre ela.
Tentou
ordenar as idéias, mas era visível que ele estava totalmente atrapalhado com a
visita inesperada da garota cujo olhar provocava-lhe calafrios na barriga.
-
Posso entrar ou você vai me deixar aqui parada no portão? – indagou ela
sorridente tentando despertar Hanz do êxtase no qual se encontrava.
- Ah
sim, claro... Pô, desculpa Tati, é que eu não esperava receber visitas a essa
hora, fiquei meio atrapalhado. – disse o rapaz encaminhando-se para destrancar
o portão.
- É,
eu percebi. Mas olha, se eu estiver atrapalhando eu vou embora, não tem
problema...
- Que
é isso, não atrapalha em nada. Entra aí. – disse Hanz abrindo o portão, ainda
meio atrapalhado e gaguejante.
- O
que estava fazendo? Hum... deixa eu ver... estava na internet né? Sabe, eu acho
que esse negócio deixa as pessoas meio bitoladas e aposto que você ficou o dia
todo nesse negócio. – disse ela já à sua frente, cara a cara com ele.
Hanz
ficou ainda mais sem jeito, tanto pela proximidade da garota como por ela
criticar algo que tanto o agradava.
Resolveu
mudar de assunto.
-
Deixa eu colocar sua moto aqui pra dentro, ultimamente não tá dando pra confiar
muito em deixar na rua não.
-
Ok... se você acha melhor... eu não conheço muito por aqui. – concordou a bela
garota entregando-lhe as chaves.
Hanz
vai até a calçada prosseguir em sua ação e percebe que a meia-dúzia de
desocupados que sempre ficava na rua cumpria seu papel. Isso o irritava porque
de certa forma eles controlavam a vida dos moradores da pequena travessa,
inclusive a sua, e o fato de ter a vida monitorada por aquele bando de imbecis
o irritava.
Isso
não o irritava mais que os comentários que eram feitos.
- Êta
Hanz heim, hoje o bicho vai pegar!! – brincou Wagner em relação à presença de
Tatiana em sua casa.
Foi o
suficiente para que Hanz detonasse...
- Vai
pegar o que meu? Escuta, será que vocês não tem mais nada pra fazer do que
ficarem cuidando da vida dos outros não?
-
Qual é cara, tá ficando louco é? – retrucou Wagner.
-
Pára Hanz, deixa quieto isso. Não esquenta com esses babacas não. – interveio
Tatiana, mas sem sucesso.
-
Porra meu, não tem uma vez que eu chegue no portão e não tenha um desocupado de
olho no que eu tô fazendo. Depois ficam especulando sobre o que eu faço ou o
que acontece aqui em casa. Porra, vão procurar o que fazer!!!
Antes
que a discussão de prolongasse Hanz entrou com a moto para o quintal e deixou
Wagner falando sozinho.
-
Desculpa Tati, é que esses babacas me tiram do sério, desculpa mesmo.
- Ah,
normal, eu sei bem como é isso. Comigo acontece a mesma coisa, a diferença é
que lá na rua são umas velhas fofoqueiras que cuidam da vida de todo mundo. Não
esquenta comigo não porque eu sei bem como é.
Hanz
fez sinal para que Brutus fosse para o fundo do quintal e colocou a moto no
local onde ele estava deitado, pois era coberto.
-
Tadinho do Brutus, você nem deixa ele brincar comigo poxa...
-
Brincar? Pô Tati, esse bicho é um cavalo, ele vai te arranhar toda com aquelas
unhas.
-
Corta essa vai, você sabe que eu não tenho essas frescuras. Mas tudo bem, o
cachorro é seu...
- Ah,
não fala assim. Deixa eu chamar ele então, já que você veio até aqui pra ver
ele...
- Não
bobo, deixa ele lá. Vamos entrar porque com a polícia passando é dose ficar
aqui. – disse Tatiana referindo-se à Wagner e os demais rapazes que passavam em
frente à casa de Hanz.
- É,
é melhor mesmo. – concordou ele olhando feio para eles.
-
Posso ir ao banheiro rapidinho? – indagou ela colocando a mão em seu ombro.
- Pô,
claro Tati. Vai lá, você já sabe onde fica.
Hanz
teve tempo de ordenar seus pensamentos pois até então ele parecia agir no
piloto automático.
Sentiu
um arrepio na espinha ao ver-se sozinho com a garota em sua casa e riu baixinho
ao imaginar a cara de Renzo se imaginasse o que estava acontecendo.
Hanz
era meio lento em relação à esse tipo de coisa, ainda não sabia quais eram as
intenções de Tatiana com aquela visita e temia fazer alguma coisa que estragasse
a amizade existente entre eles, porém também temia bancar o otário em não
perceber qualquer segunda intenção da parte dela.
“Vamos
deixar rolar e ver no que que dá.” – pensou ele tentando relaxar diante do
inesperado acontecimento.
Já
acomodados na sala os dois puderam conversar mais sossegados.
- Mas
e aí Tati, que milagre você aparecer por aqui. Aconteceu alguma coisa?
-
Não, tá tudo bem, é que eu estava em casa sozinha e imaginei que você também
deveria estar e resolvi passar por aqui pra saber se podia jantar com você.
Podia telefonar antes mas quis fazer uma surpresa. Curti o nosso papo na
quinta-feira e queria repetir a dose, só que com mais tempo dessa vez, aquela
vez não tivemos muito tempo né? Fiz mal? – ao mesmo tempo em que passava uma
imagem forte e segura Tatiana deixava transparecer uma meiguice que encantava
Hanz.
- Que
nada Tati, também estava ansioso pra repetir a dose e hoje é um ótimo dia pra
isso. Só que eu vou pedir pra entregarem alguma coisa aqui em casa mesmo, pode
ser? Não tô muito a fim de sair não...
- Por
mim tá beleza. Pode ser comida chinesa? Faz dias que tô morrendo de vontade.
-
Claro, eu também adoro, mas é melhor pedir logo porque de sábado eles demoram
pra caramba pra entregar. – disse Hanz pegando o telefone.
-
Pode ser, já tá meio tarde. Olha Hanz, sem querer ser folgada, mas enquanto
você faz o pedido será que eu posso tomar um banho rapidinho? Essas roupas são
muito quentes e com o calor que está fazendo...
Ele
ficou pasmo com o pedido de Tatiana, era óbvio que esse era o sinal que ele
esperava para saber quais as reais intenções daquela visita.
Mas
será que ela realmente tinha segundas intenções? O jeito mais descolado dela
fazia com que Hanz ainda ficasse na dúvida pois talvez pra ela aquilo fosse
normal. Pra ela não era? Homens costumam ter a mente mais poluída mesmo, mas e
para ela?
Apenas
as próximas horas poderiam revelar isso.
Enquanto
ela se banhava Hanz fez os pedidos conforme combinado, desligou o computador e
colocou o cd de um cantor que ela havia citado logo antes de ir para o
banheiro.
Sentia-se
como um adolescente diante daquela situação, imaginou numa forma para espiá-la
durante o banho mas percebeu o quanto isso era ridículo, além de inviável
devido à disposição do banheiro.
Enquanto
ela se banhava calmamente ele estava jogado no sofá ouvindo os acordes de Sweet
Dreams do Marilyn Manson, o cantor que ela havia citado logo antes, e percebia
que ela acompanhava a música enquanto estava debaixo do chuveiro. A situação
estava a ponto de enlouquecê-lo.
“Doces
sonhos” dizia a música, e Hanz viajava sobre o que poderia acontecer naquela
noite, parecia ainda não acreditar naquilo tudo.
Mas a
razão o chamava de volta à realidade e Hanz então cogitava sobre a possibilidade
de nada acontecer, ela poderia estar agindo normalmente já que não era nada
convencional, sem ter nenhuma segunda intenção, o que o decepcionaria bastante.
“Que
droga!! Faz tanto tempo assim que não saio com uma garota que não sei mais
identificar as intenções delas? Saco... eu nunca fui muito bom nessas
coisas...” – pensou ele irritado com sua própria indecisão.
Mas o
momento de solidão que permitia à Hanz refletir sobre a situação não durou
muito.
Quando
Tatiana saiu do banheiro enrolada na toalha que lhe havia sido emprestada pelo
dono da casa todas as dúvidas desapareceram.
Hanz
estava sem ação, ficou observando Tatiana calado, e o mesmo se deu por parte
dela.
Tatiana
não se conteve.
- O
que foi? Viu um fantasma é?
Hanz,
envergonhado imaginando seu próprio rosto atônito admirando-a, levantou-se.
-
Não, não. Apenas me impressiono em perceber, cada dia mais, o quanto você é
bonita. – a frase saíra naturalmente sem Hanz dar-se conta do que dizia, como
se aquilo fosse um desabafo. A frase deixou ambos corados de vergonha.
Qualquer
impulso maior só foi contido devido à buzina do motoqueiro em frente à casa.
Era o pedido que chegara.
Infelizmente
a qualidade do atendimento do restaurante chinês estava de parabéns e Hanz foi receber
a encomenda que havia chegado bem antes do que previam.
Ao
retornar, Tatiana quis prolongar a conversa.
-
Valeu pelo elogio Hanz, mas é bom você não se esquecer de que eu vim aqui só
pra gente conversar.
A
expressão irônica no semblante da garota era a peça que faltava para que Hanz
desvendasse aquele mistério que o desnorteava.
-
Tudo bem Tati, pode deixar que eu não vou me esquecer disso. Nossa, entregaram
rápido hoje heim... – disfarçou ele encabulado.
- É
verdade, o movimento deve estar fraco lá hoje. – concordou ela.
Mesmo
com o traje que enlouquecia Hanz, somente a toalha envolta no corpo provocante
de Tatiana, a conversa prosseguiu normalmente entre os dois até então como bons
amigos.
Música,
cidades, filmes, a gama de assuntos parecia nunca se findar de forma que a
última conversa que haviam tido durante o rápido almoço havia se tornado um
aperitivo diante da que tinham naquele momento.
Já
haviam saboreado o prato que Hanz havia pedido com o acompanhamento da cerveja
que Hanz, apesar de dificilmente beber, sempre tinha em sua geladeira.
A
conversa se estendia por horas e horas sem que percebessem, ambos cada vez
sentindo-se mais à vontade na companhia um do outro devido à bebida que ainda
consumiam calmamente, sentados no tapete da sala, e quando deram por si já era
quase uma hora da manhã.
- Não
entendo como você pode viver assim sozinho. Ficar em casa só mexendo no
computador, lendo... Você não enjoa não?
- Pra
falar a verdade tem horas em que sinto falta de companhia sim Tati. Mas essa é
a vida com que sempre sonhei. Essa liberdade, essa independência... eu gosto
muito disso.
- É,
tem horas que eu também gosto de ficar sozinha também... solitária... apenas
comigo mesma, acho que todos se sentem assim, todos tem essa vontade às
vezes...
Hanz
concordou com a cabeça. Ele se deliciava observando-a falar.
Seus
longos cabelos lisos e negros contrastavam com sua pele alva onde podia-se ver
algumas tatuagens... ela tinha uma beleza bastante peculiar e um charme
encantador.
Hanz
já havia notado sua beleza, mas naquela noite ele podia observar com mais
acuidade os dotes físicos de Tatiana e estava encantado não somente com seu
corpo mas com seu charme e inteligência.
Percebeu
que quando estavam a sós, como naquele almoço, o comportamento dela parecia
mudar. Ela se tornava mais doce, perdia aquele ar radical e masculinizado que
lhe causava repúdio. Era como se aquele fosse um personagem que ela utilizava
quando estava em meio à outras pessoas, e agora, sozinha com ele, deixasse
transparecer seu verdadeiro caráter. Um caráter que o encantava.
-
Tati, não sei se é apenas impressão minha, mas você fica muito diferente quando
estamos apenas nós dois. Eu já tinha reparado isso no almoço que tivemos, e
agora eu tenho mais certeza disso ainda. – comentou ele olhando dentro de seus
olhos que infelizmente ainda estavam demasiado distantes dos dele.
Ela
sorriu encabulada, aquele fato parecia ser um segredo que ela guardava à sete
chaves e que infelizmente havia sido descoberto por Hanz.
-
Você acha isso é? Bom... acho que tem muitas coisas sobre mim que você ainda
não sabe, quem sabe um dia você descubra... – respondeu ela retribuindo-lhe o
olhar nos olhos.
Ambos
ficaram em silêncio, sem saber o que dizer, talvez pensando sobre qual poderia
ser o desfecho daquilo tudo.
-
Poxa Hanz, você é um cara legal, interessante, tem uma vida legal... deve ter
um monte de garotas que ficam atrás de você não é?
-
Obrigado pelos elogios Tati, mas na verdade eu nem me acho legal assim não. Já
tive algumas namoradas que quando me conheceram melhor odiaram o meu jeito.
Reclamavam que eu era muito parado, que não curtia baladas, essas coisas.
Diziam que eu aparentava ter uns quarenta anos, tinha o espírito de um velho e
que meu jeito não era como o de um cara da minha idade, por causa disso que
esses meus namoros não deram certo eu acho, mas fazer o que né? A verdade é que
eu sou bem reservado mesmo, e acho que é por causa disso que nem tenho mulheres
atrás de mim. Eu também não sou de ficar saindo, conheceria alguém interessante
onde? Na padaria, no mercado ou no serviço? Fica difícil mesmo, mas a verdade é
que eu tô bem sossegado, não fico pensando muito nisso não.
- É,
hoje em dia é difícil encontrar alguém da sua idade assim mesmo. Os caras só
querem saber de farra e bagunça, não estão afim de coisa séria não, só querem
bagunçar. Mas é uma pena que elas não tenham valorizado as suas qualidades,
azar o delas né? É como diz aquele ditado: sempre existe uma tampa pra cada panela.
Um dia você vai encontrar a sua...
Nenhum
deles era mais criança ou inocente a ponto de não saberem a que destino aquele
caminho seguia, mas Hanz ainda se perguntava se realmente era aquilo que ele
desejava.
“Se
ela fosse sempre assim doce... feminina... sem aquele monte de gírias e aquele
modo machão de falar... Pra que ocultar uma mulher tão linda e encantadora
atrás de uma figura tão grosseira? Seria pedir muito que ela sempre fosse assim
como demonstra ser agora? Pedir que ela deixasse aquela moto e aquelas roupas
que vestia? Provavelmente ela iria se ofender se eu pedisse que abandonasse
esse jeito dela...” – pensava Hanz.
Tatiana
também estava mergulhada em seus pensamentos: “Ele é um cara fantástico.
Respeitador, bonito, educado... O que acontece comigo que não consigo me
entregar à ele por completo? O que me impede? Mas ele apenas se encanta com
essa visão que está tendo de mim agora. Eu sei que ele não gosta do modo como
me visto e me comporto, é um direito dele, é o gosto dele. Mas será que ele
desejaria estar aqui conversando comigo se conhecesse algumas coisas do meu
passado?”
Um
silêncio constrangedor invadira a casa, o cd que Hanz colocara para tocar já
havia terminado à algum tempo e ambos pareciam ainda não ter se dado conta disso.
O constrangimento acontecia devido ao fato de o silêncio denunciar que ambos
estavam imersos em seus próprios pensamentos, um sem saber no que o outro
pensava, sem imaginar o que se passava dentro de suas cabeças.
Hanz
decidiu quebrar o silêncio com uma confissão.
-
Nossa Tati, fazia tempo que não me sentia assim tão à vontade com alguém. Nem
consigo me lembrar da última vez que comi assim, sentado no tapete. Acho que
aqui nessa casa ainda não tinha feito isso acredita?
-
Pior que acredito. Você não se cansa de ser assim tão certinho não?
Hanz
levantou-se repentinamente e foi rumo à porta. Tatiana ficou assustada,
imaginou que algo não estivesse bem.
- O
que foi? Aconteceu alguma coisa? Pra onde você vai?
-
Fique tranqüila Tati. Só vou trancar a porta. Acho que ninguém vai mais passar
por ela hoje, e não é muito conveniente deixar a porta destrancada não acha? –
Hanz, pelo seu olhar, já havia deixado toda sua inibição de lado.
-
Hum... então eu vou passar a noite aqui é?
Aproximando-se
lentamente, com os olhos fixos nos dela e o calafrio percorrendo-lhe não
somente o estômago, Hanz ajoelhou-se diante de Tatiana.
- Vai
sim Tati, hoje você vai saber o que acontece quando eu me canso de ser
certinho. – abraçando-a, Hanz passou a beijar sua boca lentamente.
Tatiana
passou os braços por seu pescoço e correspondeu àquele tão almejado beijo.
Já
não haviam mais dúvidas nem preconceitos e ambos entregavam-se àquela paixão
que nenhum dos dois sabia quando ou onde se iniciara mas que os levava até
aquele momento... àquela situação.
Logo
a toalha que envolvia o corpo de Tatiana estava sob o sofá e o que se seguiu é
facilmente imaginável, não havendo portanto a necessidade de ser aqui descrito
já que não se trata de um romance erótico de Bocagge.
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