terça-feira, 8 de abril de 2014

Capítulo XXVIII



  - Vamos lá pra dentro, daí dá pra gente conversar mais sossegados. – sugere Hanz à Paulo e Cibele que já o esperavam em frente à sua casa.
  - Toda vez que eu chego aqui esses caras estão ali sem fazer nada. Pô, eles não tem mais o que fazer não? – indaga Renzo sobre os rapazes que sempre estão ali na travessa.
  - Provavelmente não. Tem horas que enche o saco isso, eles cuidam da vida de todo mundo, Ficam vendo quem chega, quem sai, pô, um saco isso. Mas deixa eles, não valem o que comem. – responde Hanz que também não simpatiza nada com aquela situação.
  - Bem coisa de boyzinho isso. Se tivessem que dar um trampo e tals não teriam tempo de ficarem aí sem fazer nada. Se eles quiserem eu arrumo umas lajes pra eles encherem. – fala Paulo com seu já costumeiro mau humor.
  Mesmo com a frase sendo dita em tom sério Hanz e Renzo não resistem e caem na risada.
  - Qual foi a graça mano? Tô falando sério pô. Isso é coisa de gente desocupada. Velho aposentado até vai, mas pô, esses caras ficam o dia todo sem fazer nada aí.
  - A gente sabe que você tá falando sério Paulo. Mas fala a verdade, você acha que esses caras agüentam encher uma laje? Não agüentam mesmo!!!! – fala Hanz já fazendo sinal para que Brutus vá se deitar e não importune as visitas.
  - Bom, segundo o que você diz eles nem desconfiam de nada né Hanz? Eu fico um pouco preocupada. – fala Cibele visivelmente aflita com a proximidade do horário da execução das ações da noite e olhando amedrontada para o enorme cão deitado próximo à eles.
  Enquanto adentram a sala de Hanz, prosseguem com a conversa.
  - Fica sossegada Cibele, esses caras nem fazem idéia. Já até vieram em especular, mas não sabem de nada. Mas e aí, pronta pra hoje?
  - É, acho que sim. Sempre pinta aquela pontinha de nervosismo, mas nada que não dê pra superar. Estou ansiosa, é verdade, mas creio que todos estejam né.
  - Com certeza todos estão, com exceção dos que não farão nada, como eu. – fala Paulo.
  Renzo e Hanz entreolham-se mas preferem ignorar a declaração provocativa dele.
  - Claro, todos estão. Acho que nunca me acostumarei com isso. Tem horas que acho que não nasci pra isso, mas enfim, fazer o que né...
  - Fica tranqüila Ci, vai dar tudo certo. Não tem mistério não, é só fazer conforme o Jean explicou e tudo fica bem. Você sabe que eu iria no seu lugar na boa, mas temos que evitar dar bandeira. Não dá pra ficar se ausentando do trampo. – fala Renzo.
  - Eu sei disso, mas eu quero participar, não quero que ninguém faça por mim. Só fico um pouco nervosa, mas isso passa. Quando chega a “hora H” o nervosismo passa, foi assim daquela vez também.
  - É assim mesmo, todo mundo fica assim. É um misto de nervosismo e ansiedade, mas não esquenta não porque eu também sinto isso. Só tenho que acertar uma coisa com você... – Hanz olha para Renzo pois teme alguma reação negativa por parte de Paulo.
  - Espero que não seja nada grave, o que foi Hanz?
  - É que eu acho melhor você ir com meu carro pro local da ação. Sabe o que acontece? Vou explicar. É que o carro alugado tem a quilometragem controlada e temos que evitar dar margem para qualquer desconfiança. Eu usando o alugado aqui na cidade não há motivo para chamar a atenção. Daí eu uso ele aqui pra fazer o ataque e você usa o Pajerão pra ir até seu alvo. Tudo bem pra você?
  O nervosismo de Cibele visivelmente aumenta, mas Paulo se antecipa.
  - Nada disso mano, o combinado era o alugado ficar com a Cibele e é assim que vai ser. Fica você com seu carro de boy e divirta-se com ele, não inventa de querer mudar o planejado não. Você não manda nada mano.
  Hanz fica enfurecido com tamanha ignorância por parte dele.
  - Na boa Paulo, cala sua boca cara. Eu acabei de explicar o motivo de eu querer que ela use meu carro. Larga a mão de ser burro meu, em que vai mudar o fato e ela usar o meu carro? Quem tem que decidir se aceita é ela, não perguntei nada pra você. Fica na sua beleza?
  - Fico na minha o caramba mano!!! Quem você pensa que é pra falar comigo desse jeito? Já disse que não é você quem manda no grupo cara, o combinado não tinha sido esse então não inventa de querer fazer as coisas do seu jeito agora, vamos fazer conforme o combinado ou então não vamos fazer nada deu pra entender mano?
  Hanz perde o controle, a situação fica crítica entre os dois.
- “Mano” o cacete!!! Pára de me chamar de “mano” cara, você não tá falando com seus amiguinhos não, você tá falando comigo certo? Presta bem atenção em como você fala comigo meu, tô de saco cheio de você pegando no meu pé.
  - Eu falo do jeito que eu quiser branquelo, você vai fazer o quê? – fala Paulo se levantando desafiadoramente.
  Renzo se antecipa e com um empurrão faz com que ele se sente novamente.
  - Manera vocês dois aí? Vocês tão ficando loucos é? A gente tá aqui pra acertar as coisas do grupo e não pros dois ficarem brigando feito moleque não. – fala ele com sua voz estrondosa. Era óbvio que ele estava do lado de Hanz pois era perceptível que Paulo só queria tumultuar, mas aparentou imparcialidade para tranqüilizar seu amigo de longa data.
  - Como eu já disse, a Cibele fará conforme tinha sido combinado. Não vem com essa de querer mudar a coisa encima da hora não. – insiste Paulo.
  - Bom, quanto a isso fale por você que não vai fazer nada mesmo. Já disse que estou falando com a Cibele cara, não tô falando com você. Você é surdo ou burro? Me explica isso porque eu não entendi ainda.
  Os ânimos começam a se exaltar novamente. A paciência de Hanz em relação à Paulo parece ter acabado definitivamente.
  - Dá pros dois se controlarem? Parecem crianças pô. Fica na sua Paulo, quem tem que resolver as coisas aqui são o Hanz e a Cibele. Não se mete cara, cada dia que passa você parece que tá mais xarope, dá um tempo!!!! – intervém Renzo mais uma vez.
  - Vai defender o amiguinho é? Por que tá do lado dele Renzo? Só porque o cara tem grana? Belo amigo é você heim!!! Interesseiro maldito!!!! Filho da mãe!!!! – fala Paulo levantando-se da poltrona novamente.
  - Como é que é? Presta atenção pra ver com quem você tá falando Paulo. Você sabe que tá errado cara, faz tempo que você tá escroto, eu já falei com você sobre isso mas parece que não adiantou nada. Eu não tô do lado de ninguém não fiote, ou melhor, tô sim. Tô do lado de quem tá certo e se o Hanz acha melhor fazer do jeito que ele tá falando eu assino embaixo porque concordo com ele. Coloca essa cabeça pra funcionar e pára de falar tanta imbecilidade, tá mais do que na hora. – fala Renzo também se levantando e encarando o rapaz.
  É evidente que não há a menor possibilidade de Paulo querer brigar com Renzo pois a diferença existente entre os dois é brutal, e sabendo disso ele fica imóvel, olhando dentro dos olhos do grandalhão.
  Provavelmente Paulo está desarmado, pois se portasse uma arma certamente atiraria na cara de Renzo, isso dá pra se perceber pelos olhos do rapaz. Olhos tomados de ira, ódio...
  O rapaz está ainda mais agressivo do que costumava ser ultimamente e nem sequer tenta ponderar sobre o que está sendo conversado, simplesmente discorda asperamente sem se importar com Hanz e nem mesmo com Renzo.
  - Quer saber, vão lá pra fora vocês dois. Deixem que eu e a Cibele nos entendemos. Nem sei o que vocês estão fazendo aqui, o papo é entre eu e ela. – fala Hanz também de pé.
  - Paulo, me espera lá no carro meu amor, eu vou acertar as coisas aqui e a gente já vai embora rapidinho. Fica calmo, não quero que ninguém aqui brigue, não foi pra isso que viemos aqui. – fala Cibele segurando seu marido pelo ombro.
  - Não quero você aqui sozinha com esse sujeito Ci, só vou sair quando você for comigo. – fala Paulo ainda encarando Renzo.
  Hanz baixa a cabeça e faz sinal negativo desaprovando totalmente a atitude de Paulo.
  Realmente ele em nada se parece que aquele rapaz que ele conheceu no hospital, está muito mudado, parece ter adotado uma nova personalidade. Antes um cara prestativo, simpático, de aparência leal e companheira, tanto que Renzo convidou-o para participar do grupo. Hoje, um sujeito despeitado, rude, que procura empecilhos em tudo, discorda de tudo.
  Todos se perguntavam sobre o motivo de tamanha mudança. Nem mesmo Cibele, sua esposa, sabia explicar o motivo dessa mudança. Talvez nem mesmo ele, Paulo, soubesse explicar.
  - Vamos lá pra fora Paulo, deixa de ser xarope cara. Os dois conversam aqui e a gente conversa lá fora. Vamos, na paz cara, vamos lá pra fora. – fala Renzo colocando a amigavelmente o braço ao redor do pescoço do companheiro.
  Os dois finalmente saem para o quintal, deixando Hanz e Cibele acertarem os últimos detalhes.
  - Desculpa Hanz, do fundo do coração, desculpa. Não sei o que o Paulo tem, não sei mesmo. Não consigo entender o motivo de ele estar assim, não aconteceu nada de mais, ele simplesmente ficou esquisito de uns tempos pra cá. Continua sumindo, está diferente comigo, aliás, tá diferente com todo mundo, Por favor, desculpa. – fala Cibele novamente sentando-se na poltrona, envergonhada com a atitude do marido.
  - Tá tudo bem Cibele, fica tranqüila, infelizmente nós até já acostumamos com esse jeito estranho do Paulo, mas também não entendemos o motivo disso tudo. Mas olha, vamos nos preocupar com a ação de logo mais, é com isso que temos que nos preocupar nesse momento. E aí, o que me diz sobre usar o meu carro? Tá tudo bem pra você?
  - Pra mim acho que sim Hanz. Só fico com um pouco de medo porque seu carro é grande pra caramba e é cheio de frescuras, eu acho que não vou saber mexer nele não.
  - Bom, pra quem não tá acostumado vai ser meio estranho mesmo. Faz assim, dá umas voltas com ele, tá cedo ainda, assim você pega o jeito do bicho. Quanto aos controles, de diferente só tem mesmo o controle de tração, mas você nem precisa mexer nisso, não vai precisar, é só pra quando for pegar trilha e tal. Você só vai pegar estrada.
  - Bom, se você diz, então tá tudo bem. Só me mostra os controles direitinho, acho que não terei problema nenhum não. Não deve ser nenhum bicho de sete cabeças também.
  - É nada, é bem simples. E quanto à ação, você tem alguma dúvida e tal?
  - Não, tá tudo certinho já. Vai ser conforme planejamos, se alguma coisa der errado eu entro em contato com o Jean, mas acho que nem vai precisar não, se Deus quiser.
  - Então tá certo. Vamos lá no carro, vou te mostrar como brincar com o bichão. – fala Hanz rindo do apelido que foi colocado em seu carro.
  - Será que seu cachorro tá aí fora? Nossa, eu tenho pavor de cães. – fala Cibele referindo-se à Brutus que, pelo seu costume de ficar pulando nas visitas, a amedronta ainda mais.
  - Fica sossegada Cibele, o Brutus é adestrado, ele obedece certinho. Só que ele é brincalhão e gosta de ficar pulando nas pessoas, mas eu mando ele deitar e ele obedece, fica tranqüila que ele não vai pular em você não. – Hanz já abre a porta da sala para saírem.
  - Então tá né, se você está dizendo...
  Enquanto isso, do lado de fora, Renzo e Paulo tentam se acertar definitivamente no fundo do quintal, onde ninguém pode ouvi-los, Renzo aproveita para afagar Brutus que não sai do lado dele.
  - Fiu, eu não tô reconhecendo você não, o que é que tá acontecendo, dá pra você me falar?
  Paulo mantém o diálogo com Renzo mas evitando olhar nos olhos do seu interlocutor.
  - Não tá acontecendo nada Renzo, tá tudo tranqüilo cara. – ele aparenta um misto de medo e vergonha do amigo.
  - Não tá nada tranqüilo não fiote. Todo mundo já percebeu que você tá mudado. Você tá escroto pra caramba com o Hanz e o cara nunca te fez nada. Tudo o que o grupo decide você discorda, parece que só tá a fim de tumultuar a coisa. Fala fiu, por que você tá desse jeito? O pessoal já tá cansado disso, explica logo o que é.
  - O que acontece é que as decisões não estão mais sendo tomadas pelo grupo em conjunto, tem só dois tomando as decisões e o resto tá só seguindo atrás feito uns cachorrinhos.
  - Você tá enganado fiote. Não tem dois controlando nada. O Hanz e o Jean apenas elaboram os planos, dão as idéias, quem tiver alguma opinião à dar tem toda a liberdade pra isso. Não tem ninguém ditando as ordens aqui não, eu mesmo não aceitaria isso de quem quer que fosse e você sabe muito bem disso. Acho que você tá tendo uma visão errada dos caras.
  - É que com você eles agem diferente cara. Você, a Cibele e a Tatiana, vocês os dois ouvem, agora, toda vez que eu dou uma opinião ela é ignorada, como se eu fosse um incapaz. Será que é porque eu sou preto? Ninguém é melhor do que ninguém não. Eu tô sendo excluído de tudo cara, até da ação de hoje, me colocaram de molho de novo. Na primeira vez eu até entendi, mas de novo cara, porra...
  Renzo interrompe o amigo.
  - Peraí fiote, ninguém tá te colocando de molho nada fiu. Você e eu não vamos participar por causa dos motivos que todo mundo tá cansado de saber e acho que você tá é puto da vida só por causa disso. Mas não tem porque fiu, eu também tô de fora e não tô agindo igual à você. Hoje a gente fica de fora, mas na próxima a gente tá dentro, deixa de ser assim cara. Tudo está sendo feito pra zelar o máximo possível pela segurança de todos, não tem ninguém excluído. Não serão seis alvos pra todo mundo participar porque o cara que fornece as parada deu mancada com o Jean, só por isso fiote.
  - Tá Renzo, tudo bem. Eu tô nervoso mesmo porque a Cibele vai participar do esquema e eu não, mas nem é porque eu não farei nada, mas porque eu tô preocupado com ela. Pô cara, você sabe como eu amo a Ci, e se acontece alguma coisa com ela cara? Imagina só: acontecer alguma coisa com ela e eu sem fazer nada...
  - Eu entendo você fiu, entendo bem. Eu também ficaria preocupado se fosse comigo, mas pensa bem: quando vocês decidiram aderir ao esquema sabiam que a Cibele teria que colocar a mão na massa fiu, agora não adianta ficar assim. Eu sei que é difícil. Mas tenta ficar sossegado, ou pelo menos evitar brigar com os caras, principalmente com o Hanz, você e ele tão se estranhando demais.
  - Que bom que você me entende cara. Mas ainda assim eu continuo achando que tem uma perseguição comigo. Deve ser porque eu sou preto, esses brancos sempre se acham melhores que a gente, pensei que vocês fossem mais cabeça-feita mas pelo que eu tô vendo são tudo farinha do mesmo saco.
  - Não tem isso fiote. Você sabe que eu nunca fiz distinção nenhuma em relação a você por causa da sua cor, não vem inventar isso agora. E ouve o que eu tô te falando: dentro do grupo não existe isso por parte de ninguém, se eu tivesse percebido alguma coisa do tipo eu seria o primeiro a sair fora do esquema, você me conhece o suficiente pra saber disso. A Cibele também é negra, se fosse assim ela também estaria de molho essa noite, como você diz, e ela não tá. A gente tá de fora porque trabalhamos de noite, se faltarmos bem na noite que acontece uma das nossas ações vai dar muito na cara pô.
  Paulo fica em silêncio pensando nas palavras do amigo.
  Renzo prossegue:
  - Mas me fala uma coisa Paulo: por que você tá estranho com  a Cibele também? Ela vive falando que de uns tempos pra cá você tá estranho com ela e com o moleque de vocês também, tem alguma coisa a ver com o grupo também?
  - Isso é entre eu e ela. Ou o grupo controla também as vida particular dos seus membros agora? Fala sério Renzo, não se metam na minha vida com a Cibele, ela não diz respeito à vocês fui claro?
  - Tudo bem, concordo com você. Sua vida dentro de casa não nos diz respeito. Mas a partir do momento em que suas atitudes aparentam pôr a segurança do grupo em risco, acho que temos o direito de saber o que tá acontecendo.
  - E em que minha crise com a Cibele pode pôr em risco a segurança do grupo? Você tá ficando louco Renzo?
  - Sua crise com a Cibele, nada. Não temos nada com isso. Mas esses seus sumiços que estão acontecendo cada vez com mais freqüência estão preocupando o pessoal sim. Afinal de contas, temos que saber o que se passa com os membros do grupo pra podermos confiar em cada um deles. Dá pra você me dizer o que você tem feito durante esses sumiços?
  - Não dá não Renzo, já disse que minha vida particular diz respeito somente à mim. Fica tranqüilo cara, não vou ferrar com nenhum de vocês não. Eu tô puto com o que vocês tem feito comigo mas não é por causa disso que eu vou fazer alguma coisa pra ferrar com vocês. Eu sei que se acontecer alguma coisa com algum de vocês vai acabar sobrando pra mim e pra Cibele...
  - Sei fiu, então é só por isso que você não entrega a gente? Só porque sobra pra vocês também?
  - Não cara, eu não faço nada porque acredito nos propósitos do grupo, minha insatisfação com a forma como sou excluído não tem nada a ver com isso. Não sou nenhum traíra não Renzo. Só me admiro muito de a Cibele vir reclamar pra vocês sobre meu comportamento, vocês viraram conselheiros sentimentais agora é?
  Renzo não responde ao sarcasmo de Paulo, apenas ouve o que ele diz sem saber até que ponto aquilo tudo é digno de confiança ou não.
  No fundo ele preferia que Paulo tivesse dito o que ele fazia na companhia daqueles caras desconhecidos para pôr fim naquela dúvida de uma vez por todas, mas não havia como forçá-lo a fazer isso. Na verdade Paulo estava com a razão, sua vida particular dizia respeito somente è ele e ninguém tinha nada com isso, não havia o que fazer.
  Nesse instante puderam ouvir o motor do carro de Hanz sendo ligado, o que fez com que eles fossem até a rua para verificar o que estava acontecendo, mas antes Renzo prendeu Brutus em seu cercado ali no fundo do quintal, todos já conheciam o horror de Cibele com cães.
  - Vai me desculpar amigão, mas vai ter que ficar aí, daqui a pouco eu venho te soltar.
  Já na frente da casa eles encontram-se com Hanz e Cibele, ela parecia uma garotinha brincando com um brinquedo novo, mas nem mesmo a felicidade estampada em seu rosto é capaz de acalmar seu marido.
  - Quer dizer então que você aceitou trocar Cibele? – indagou rispidamente Paulo ao ver sua esposa no banco do motorista.
  Hanz olhou-o com reprovação pois ali não era um local seguro para discutirem sobre aquilo pois não muito longe dali estava o grupo de desocupados que sempre estava ali só de olho no que se passava na travessa.
  - O assunto já está decidido Paulo, chega dessa discussão. Não fique com raiva de mim, eu sei que você se preocupa comigo meu amor, mas acho que sou capaz de saber o que é melhor pra mim. – fala Cibele desligando o carro.
  - Tá certo então. Espero que você consiga se sair bem. Não adianta eu falar com você mesmo. Você não me dá mais ouvidos... Quer saber? Tô indo pra casa, me encontra lá, acho que você não tá precisando da minha carona. Até mais aí pessoal.
  Paulo nem sequer esperou pela resposta de sua esposa, foi para dentro do seu carro.
  - Que saco, pelo visto não adiantou nada o que eu falei com ele... fala Renzo irritado com a atitude do amigo, ou ex-amigo, nem ele mesmo sabia como referir-se à Paulo agora. Também estava cansado das atitudes dele.
  - Ele é cabeça dura Renzo. Eu mesma já conversei muito com ele. Mas enfim, deixa ele pra lá. Tô preocupada com a “viagem” de hoje, isso sim. – Cibele dá uma piscada para Hanz disfarçando o verdadeiro significado da palavra viagem por causa do grupo de rapazes que encontrava-se próximo dali, em silêncio, sem sequer disfarçar que não estavam perdendo nenhum detalhe do que se passava ali.
  - É Cibele, deixa pra lá. A “viagem” será legal, tudo será uma maravilha. – fala Hanz vendo o carro de Paulo indo embora.
  Renzo, que também se irrita com o grupo de rapazes não consegue se conter.
  - O que estraga é esse bando de gente desocupada que não faz nada da maldita vida e só fica cuidando da vida dos outros. – ele fala bem alto pro grupo de rapazes ouvir na esperança de que algum deles se manifestasse.
  Hanz já havia comentado com ele que tinha se estranhado a algum tempo atrás com Alex, e desde então Renzo nutria uma vontade crescente de que ele viesse dizer-lhe algo ofensivo para aplicar-lhe um corretivo.
  Mas nenhum deles se manifestou, era óbvio que eles sabiam quem Renzo era e provavelmente não estavam com vontade de levar uma surra naquela noite.
  - Bom rapazes, é melhor eu ir pra casa também, melhor não dar ainda mais motivos pro Paulo ficar falando na minha orelha. Fica assim então, qualquer coisa eu dou uma ligada pro Jean pra saber de alguma novidade. – fala Cibele despedindo-se de Hanz e de Paulo.
  - Tá certo então Cibele, espero que faça sol por lá pra você poder aproveitar bastante. – fala Hanz retribuindo a piscada.
  Ainda bem que Paulo não está presente nesse momento pois essas piscadelas certamente seria motivo para mais discussão.
  - É, eu também espero.
  - Se cuida heim Ci, vê se manda notícias heim, senão a gente fica preocupado. – fala Renzo.
  A seqüência de piscadas de olho chega a ser cômica, os “olheiros” da travessa não desconfiam de nada.
  Cibele entra no jipe e parte, de início com o carro aos trancos, mas finalmente parece pegar o jeito e prossegue, lenta, mas tranqüilamente.
  - Espero que ela dê conta do recado fiote. – cochicha Renzo.
  - É, eu também espero. Mas eu confio nela, tudo vai sair certinho. Em quem eu não tô confiando nem um pouco é no Paulo, hoje faltou pouco pra eu sair na porrada com ele. O cara hoje tá demais, ele perdeu completamente o bom senso.
  - Eu percebi fiote, ele realmente tá irritante, tá difícil de agüentar mesmo. Hoje ele pegou pesado, sobrou até pra mim. Eu conversei com ele, mas não descobri muita coisa, e pelo jeito também não adiantou nada os conselhos que eu dei pra ele, o bicho é teimoso feito uma mula fiote...
  - Vamos lá pra dentro, é melhor pra gente trocar uma idéia... fala Hanz conduzindo o amigo para dentro fazendo sinal para os rapazes que permaneciam à toa na travessa.
  - Gente desocupada é fogo!!! Será que alguém sabe o que é mulher??? – fala bem alto Renzo passando pelo portão. Realmente ele está doido para que algum deles venha tirar satisfação com ele.
  Com certeza eles sabiam que as indiretas eram para eles, mas e a coragem para retrucar a provocação de Renzo?
  Ambos conversaram mais um pouco mas Hanz logo demonstrou sua disposição em ficar um tempo isolado, concentrando-se no que ainda teria que fazer naquele dia.
  Mas a noite ainda reservava-lhe surpresas que fariam seus planos mudarem.

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