- Vamos lá pra dentro, daí dá pra gente
conversar mais sossegados. – sugere Hanz à Paulo e Cibele que já o esperavam em
frente à sua casa.
- Toda vez que eu chego aqui esses caras
estão ali sem fazer nada. Pô, eles não tem mais o que fazer não? – indaga Renzo
sobre os rapazes que sempre estão ali na travessa.
- Provavelmente não. Tem horas que enche o
saco isso, eles cuidam da vida de todo mundo, Ficam vendo quem chega, quem sai,
pô, um saco isso. Mas deixa eles, não valem o que comem. – responde Hanz que
também não simpatiza nada com aquela situação.
- Bem coisa de boyzinho isso. Se tivessem que
dar um trampo e tals não teriam tempo de ficarem aí sem fazer nada. Se eles
quiserem eu arrumo umas lajes pra eles encherem. – fala Paulo com seu já
costumeiro mau humor.
Mesmo com a frase sendo dita em tom sério
Hanz e Renzo não resistem e caem na risada.
- Qual foi a graça mano? Tô falando sério pô.
Isso é coisa de gente desocupada. Velho aposentado até vai, mas pô, esses caras
ficam o dia todo sem fazer nada aí.
- A gente sabe que você tá falando sério
Paulo. Mas fala a verdade, você acha que esses caras agüentam encher uma laje?
Não agüentam mesmo!!!! – fala Hanz já fazendo sinal para que Brutus vá se
deitar e não importune as visitas.
- Bom, segundo o que você diz eles nem
desconfiam de nada né Hanz? Eu fico um pouco preocupada. – fala Cibele
visivelmente aflita com a proximidade do horário da execução das ações da noite
e olhando amedrontada para o enorme cão deitado próximo à eles.
Enquanto adentram a sala de Hanz, prosseguem
com a conversa.
- Fica sossegada Cibele, esses caras nem fazem
idéia. Já até vieram em especular, mas não sabem de nada. Mas e aí, pronta pra
hoje?
- É, acho que sim. Sempre pinta aquela
pontinha de nervosismo, mas nada que não dê pra superar. Estou ansiosa, é
verdade, mas creio que todos estejam né.
- Com certeza todos estão, com exceção dos
que não farão nada, como eu. – fala Paulo.
Renzo e Hanz entreolham-se mas preferem
ignorar a declaração provocativa dele.
- Claro, todos estão. Acho que nunca me
acostumarei com isso. Tem horas que acho que não nasci pra isso, mas enfim,
fazer o que né...
- Fica tranqüila Ci, vai dar tudo certo. Não
tem mistério não, é só fazer conforme o Jean explicou e tudo fica bem. Você
sabe que eu iria no seu lugar na boa, mas temos que evitar dar bandeira. Não dá
pra ficar se ausentando do trampo. – fala Renzo.
- Eu sei disso, mas eu quero participar, não
quero que ninguém faça por mim. Só fico um pouco nervosa, mas isso passa.
Quando chega a “hora H” o nervosismo passa, foi assim daquela vez também.
- É assim mesmo, todo mundo fica assim. É um
misto de nervosismo e ansiedade, mas não esquenta não porque eu também sinto
isso. Só tenho que acertar uma coisa com você... – Hanz olha para Renzo pois
teme alguma reação negativa por parte de Paulo.
- Espero que não seja nada grave, o que foi
Hanz?
- É que eu acho melhor você ir com meu carro
pro local da ação. Sabe o que acontece? Vou explicar. É que o carro alugado tem
a quilometragem controlada e temos que evitar dar margem para qualquer
desconfiança. Eu usando o alugado aqui na cidade não há motivo para chamar a
atenção. Daí eu uso ele aqui pra fazer o ataque e você usa o Pajerão pra ir até
seu alvo. Tudo bem pra você?
O nervosismo de Cibele visivelmente aumenta,
mas Paulo se antecipa.
- Nada disso mano, o combinado era o alugado
ficar com a Cibele e é assim que vai ser. Fica você com seu carro de boy e
divirta-se com ele, não inventa de querer mudar o planejado não. Você não manda
nada mano.
Hanz fica enfurecido com tamanha ignorância
por parte dele.
- Na boa Paulo, cala sua boca cara. Eu acabei
de explicar o motivo de eu querer que ela use meu carro. Larga a mão de ser
burro meu, em que vai mudar o fato e ela usar o meu carro? Quem tem que decidir
se aceita é ela, não perguntei nada pra você. Fica na sua beleza?
- Fico na minha o caramba mano!!! Quem você
pensa que é pra falar comigo desse jeito? Já disse que não é você quem manda no
grupo cara, o combinado não tinha sido esse então não inventa de querer fazer
as coisas do seu jeito agora, vamos fazer conforme o combinado ou então não
vamos fazer nada deu pra entender mano?
Hanz perde o controle, a situação fica
crítica entre os dois.
- “Mano” o cacete!!! Pára de me chamar de “mano” cara,
você não tá falando com seus amiguinhos não, você tá falando comigo certo?
Presta bem atenção em como você fala comigo meu, tô de saco cheio de você
pegando no meu pé.
- Eu falo do jeito que eu quiser branquelo,
você vai fazer o quê? – fala Paulo se levantando desafiadoramente.
Renzo se antecipa e com um empurrão faz com
que ele se sente novamente.
- Manera vocês dois aí? Vocês tão ficando
loucos é? A gente tá aqui pra acertar as coisas do grupo e não pros dois
ficarem brigando feito moleque não. – fala ele com sua voz estrondosa. Era
óbvio que ele estava do lado de Hanz pois era perceptível que Paulo só queria
tumultuar, mas aparentou imparcialidade para tranqüilizar seu amigo de longa
data.
- Como eu já disse, a Cibele fará conforme
tinha sido combinado. Não vem com essa de querer mudar a coisa encima da hora
não. – insiste Paulo.
- Bom, quanto a isso fale por você que não
vai fazer nada mesmo. Já disse que estou falando com a Cibele cara, não tô
falando com você. Você é surdo ou burro? Me explica isso porque eu não entendi
ainda.
Os ânimos começam a se exaltar novamente. A
paciência de Hanz em relação à Paulo parece ter acabado definitivamente.
- Dá pros dois se controlarem? Parecem
crianças pô. Fica na sua Paulo, quem tem que resolver as coisas aqui são o Hanz
e a Cibele. Não se mete cara, cada dia que passa você parece que tá mais
xarope, dá um tempo!!!! – intervém Renzo mais uma vez.
- Vai defender o amiguinho é? Por que tá do
lado dele Renzo? Só porque o cara tem grana? Belo amigo é você heim!!!
Interesseiro maldito!!!! Filho da mãe!!!! – fala Paulo levantando-se da poltrona
novamente.
- Como é que é? Presta atenção pra ver com
quem você tá falando Paulo. Você sabe que tá errado cara, faz tempo que você tá
escroto, eu já falei com você sobre isso mas parece que não adiantou nada. Eu
não tô do lado de ninguém não fiote, ou melhor, tô sim. Tô do lado de quem tá
certo e se o Hanz acha melhor fazer do jeito que ele tá falando eu assino
embaixo porque concordo com ele. Coloca essa cabeça pra funcionar e pára de
falar tanta imbecilidade, tá mais do que na hora. – fala Renzo também se
levantando e encarando o rapaz.
É evidente que não há a menor possibilidade
de Paulo querer brigar com Renzo pois a diferença existente entre os dois é
brutal, e sabendo disso ele fica imóvel, olhando dentro dos olhos do
grandalhão.
Provavelmente Paulo está desarmado, pois se
portasse uma arma certamente atiraria na cara de Renzo, isso dá pra se perceber
pelos olhos do rapaz. Olhos tomados de ira, ódio...
O rapaz está ainda mais agressivo do que
costumava ser ultimamente e nem sequer tenta ponderar sobre o que está sendo
conversado, simplesmente discorda asperamente sem se importar com Hanz e nem
mesmo com Renzo.
- Quer saber, vão lá pra fora vocês dois.
Deixem que eu e a Cibele nos entendemos. Nem sei o que vocês estão fazendo
aqui, o papo é entre eu e ela. – fala Hanz também de pé.
- Paulo, me espera lá no carro meu amor, eu
vou acertar as coisas aqui e a gente já vai embora rapidinho. Fica calmo, não
quero que ninguém aqui brigue, não foi pra isso que viemos aqui. – fala Cibele
segurando seu marido pelo ombro.
- Não quero você aqui sozinha com esse
sujeito Ci, só vou sair quando você for comigo. – fala Paulo ainda encarando
Renzo.
Hanz baixa a cabeça e faz sinal negativo
desaprovando totalmente a atitude de Paulo.
Realmente ele em nada se parece que aquele
rapaz que ele conheceu no hospital, está muito mudado, parece ter adotado uma
nova personalidade. Antes um cara prestativo, simpático, de aparência leal e
companheira, tanto que Renzo convidou-o para participar do grupo. Hoje, um
sujeito despeitado, rude, que procura empecilhos em tudo, discorda de tudo.
Todos se perguntavam sobre o motivo de
tamanha mudança. Nem mesmo Cibele, sua esposa, sabia explicar o motivo dessa
mudança. Talvez nem mesmo ele, Paulo, soubesse explicar.
- Vamos lá pra fora Paulo, deixa de ser
xarope cara. Os dois conversam aqui e a gente conversa lá fora. Vamos, na paz
cara, vamos lá pra fora. – fala Renzo colocando a amigavelmente o braço ao
redor do pescoço do companheiro.
Os dois finalmente saem para o quintal,
deixando Hanz e Cibele acertarem os últimos detalhes.
- Desculpa Hanz, do fundo do coração,
desculpa. Não sei o que o Paulo tem, não sei mesmo. Não consigo entender o
motivo de ele estar assim, não aconteceu nada de mais, ele simplesmente ficou
esquisito de uns tempos pra cá. Continua sumindo, está diferente comigo, aliás,
tá diferente com todo mundo, Por favor, desculpa. – fala Cibele novamente
sentando-se na poltrona, envergonhada com a atitude do marido.
- Tá tudo bem Cibele, fica tranqüila,
infelizmente nós até já acostumamos com esse jeito estranho do Paulo, mas
também não entendemos o motivo disso tudo. Mas olha, vamos nos preocupar com a
ação de logo mais, é com isso que temos que nos preocupar nesse momento. E aí,
o que me diz sobre usar o meu carro? Tá tudo bem pra você?
- Pra mim acho que sim Hanz. Só fico com um
pouco de medo porque seu carro é grande pra caramba e é cheio de frescuras, eu
acho que não vou saber mexer nele não.
- Bom, pra quem não tá acostumado vai ser
meio estranho mesmo. Faz assim, dá umas voltas com ele, tá cedo ainda, assim
você pega o jeito do bicho. Quanto aos controles, de diferente só tem mesmo o
controle de tração, mas você nem precisa mexer nisso, não vai precisar, é só
pra quando for pegar trilha e tal. Você só vai pegar estrada.
- Bom, se você diz, então tá tudo bem. Só me
mostra os controles direitinho, acho que não terei problema nenhum não. Não
deve ser nenhum bicho de sete cabeças também.
- É nada, é bem simples. E quanto à ação,
você tem alguma dúvida e tal?
- Não, tá tudo certinho já. Vai ser conforme
planejamos, se alguma coisa der errado eu entro em contato com o Jean, mas acho
que nem vai precisar não, se Deus quiser.
- Então tá certo. Vamos lá no carro, vou te
mostrar como brincar com o bichão. – fala Hanz rindo do apelido que foi
colocado em seu carro.
- Será que seu cachorro tá aí fora? Nossa, eu
tenho pavor de cães. – fala Cibele referindo-se à Brutus que, pelo seu costume
de ficar pulando nas visitas, a amedronta ainda mais.
- Fica sossegada Cibele, o Brutus é
adestrado, ele obedece certinho. Só que ele é brincalhão e gosta de ficar
pulando nas pessoas, mas eu mando ele deitar e ele obedece, fica tranqüila que
ele não vai pular em você não. – Hanz já abre a porta da sala para saírem.
- Então tá né, se você está dizendo...
Enquanto isso, do lado de fora, Renzo e Paulo
tentam se acertar definitivamente no fundo do quintal, onde ninguém pode
ouvi-los, Renzo aproveita para afagar Brutus que não sai do lado dele.
- Fiu, eu não tô reconhecendo você não, o que
é que tá acontecendo, dá pra você me falar?
Paulo mantém o diálogo com Renzo mas evitando
olhar nos olhos do seu interlocutor.
- Não tá acontecendo nada Renzo, tá tudo
tranqüilo cara. – ele aparenta um misto de medo e vergonha do amigo.
- Não tá nada tranqüilo não fiote. Todo mundo
já percebeu que você tá mudado. Você tá escroto pra caramba com o Hanz e o cara
nunca te fez nada. Tudo o que o grupo decide você discorda, parece que só tá a fim
de tumultuar a coisa. Fala fiu, por que você tá desse jeito? O pessoal já tá
cansado disso, explica logo o que é.
- O que acontece é que as decisões não estão
mais sendo tomadas pelo grupo em conjunto, tem só dois tomando as decisões e o
resto tá só seguindo atrás feito uns cachorrinhos.
- Você tá enganado fiote. Não tem dois
controlando nada. O Hanz e o Jean apenas elaboram os planos, dão as idéias,
quem tiver alguma opinião à dar tem toda a liberdade pra isso. Não tem ninguém
ditando as ordens aqui não, eu mesmo não aceitaria isso de quem quer que fosse
e você sabe muito bem disso. Acho que você tá tendo uma visão errada dos caras.
- É que com você eles agem diferente cara.
Você, a Cibele e a Tatiana, vocês os dois ouvem, agora, toda vez que eu dou uma
opinião ela é ignorada, como se eu fosse um incapaz. Será que é porque eu sou
preto? Ninguém é melhor do que ninguém não. Eu tô sendo excluído de tudo cara,
até da ação de hoje, me colocaram de molho de novo. Na primeira vez eu até
entendi, mas de novo cara, porra...
Renzo interrompe o amigo.
- Peraí fiote, ninguém tá te colocando de
molho nada fiu. Você e eu não vamos participar por causa dos motivos que todo
mundo tá cansado de saber e acho que você tá é puto da vida só por causa disso.
Mas não tem porque fiu, eu também tô de fora e não tô agindo igual à você. Hoje
a gente fica de fora, mas na próxima a gente tá dentro, deixa de ser assim
cara. Tudo está sendo feito pra zelar o máximo possível pela segurança de
todos, não tem ninguém excluído. Não serão seis alvos pra todo mundo participar
porque o cara que fornece as parada deu mancada com o Jean, só por isso fiote.
- Tá Renzo, tudo bem. Eu tô nervoso mesmo
porque a Cibele vai participar do esquema e eu não, mas nem é porque eu não
farei nada, mas porque eu tô preocupado com ela. Pô cara, você sabe como eu amo
a Ci, e se acontece alguma coisa com ela cara? Imagina só: acontecer alguma
coisa com ela e eu sem fazer nada...
- Eu entendo você fiu, entendo bem. Eu também
ficaria preocupado se fosse comigo, mas pensa bem: quando vocês decidiram
aderir ao esquema sabiam que a Cibele teria que colocar a mão na massa fiu,
agora não adianta ficar assim. Eu sei que é difícil. Mas tenta ficar sossegado,
ou pelo menos evitar brigar com os caras, principalmente com o Hanz, você e ele
tão se estranhando demais.
- Que bom que você me entende cara. Mas ainda
assim eu continuo achando que tem uma perseguição comigo. Deve ser porque eu
sou preto, esses brancos sempre se acham melhores que a gente, pensei que vocês
fossem mais cabeça-feita mas pelo que eu tô vendo são tudo farinha do mesmo
saco.
- Não tem isso fiote. Você sabe que eu nunca
fiz distinção nenhuma em relação a você por causa da sua cor, não vem inventar
isso agora. E ouve o que eu tô te falando: dentro do grupo não existe isso por parte
de ninguém, se eu tivesse percebido alguma coisa do tipo eu seria o primeiro a
sair fora do esquema, você me conhece o suficiente pra saber disso. A Cibele
também é negra, se fosse assim ela também estaria de molho essa noite, como
você diz, e ela não tá. A gente tá de fora porque trabalhamos de noite, se
faltarmos bem na noite que acontece uma das nossas ações vai dar muito na cara
pô.
Paulo fica em silêncio pensando nas palavras
do amigo.
Renzo prossegue:
- Mas me fala uma coisa Paulo: por que você
tá estranho com a Cibele também? Ela
vive falando que de uns tempos pra cá você tá estranho com ela e com o moleque
de vocês também, tem alguma coisa a ver com o grupo também?
- Isso é entre eu e ela. Ou o grupo controla
também as vida particular dos seus membros agora? Fala sério Renzo, não se
metam na minha vida com a Cibele, ela não diz respeito à vocês fui claro?
- Tudo bem, concordo com você. Sua vida
dentro de casa não nos diz respeito. Mas a partir do momento em que suas
atitudes aparentam pôr a segurança do grupo em risco, acho que temos o direito
de saber o que tá acontecendo.
- E em que minha crise com a Cibele pode pôr
em risco a segurança do grupo? Você tá ficando louco Renzo?
- Sua crise com a Cibele, nada. Não temos
nada com isso. Mas esses seus sumiços que estão acontecendo cada vez com mais
freqüência estão preocupando o pessoal sim. Afinal de contas, temos que saber o
que se passa com os membros do grupo pra podermos confiar em cada um deles. Dá
pra você me dizer o que você tem feito durante esses sumiços?
- Não dá não Renzo, já disse que minha vida
particular diz respeito somente à mim. Fica tranqüilo cara, não vou ferrar com
nenhum de vocês não. Eu tô puto com o que vocês tem feito comigo mas não é por
causa disso que eu vou fazer alguma coisa pra ferrar com vocês. Eu sei que se
acontecer alguma coisa com algum de vocês vai acabar sobrando pra mim e pra
Cibele...
- Sei fiu, então é só por isso que você não
entrega a gente? Só porque sobra pra vocês também?
- Não cara, eu não faço nada porque acredito
nos propósitos do grupo, minha insatisfação com a forma como sou excluído não
tem nada a ver com isso. Não sou nenhum traíra não Renzo. Só me admiro muito de
a Cibele vir reclamar pra vocês sobre meu comportamento, vocês viraram
conselheiros sentimentais agora é?
Renzo não responde ao sarcasmo de Paulo,
apenas ouve o que ele diz sem saber até que ponto aquilo tudo é digno de
confiança ou não.
No fundo ele preferia que Paulo tivesse dito
o que ele fazia na companhia daqueles caras desconhecidos para pôr fim naquela
dúvida de uma vez por todas, mas não havia como forçá-lo a fazer isso. Na
verdade Paulo estava com a razão, sua vida particular dizia respeito somente è
ele e ninguém tinha nada com isso, não havia o que fazer.
Nesse instante puderam ouvir o motor do carro
de Hanz sendo ligado, o que fez com que eles fossem até a rua para verificar o
que estava acontecendo, mas antes Renzo prendeu Brutus em seu cercado ali no
fundo do quintal, todos já conheciam o horror de Cibele com cães.
- Vai me desculpar amigão, mas vai ter que
ficar aí, daqui a pouco eu venho te soltar.
Já na frente da casa eles encontram-se com
Hanz e Cibele, ela parecia uma garotinha brincando com um brinquedo novo, mas
nem mesmo a felicidade estampada em seu rosto é capaz de acalmar seu marido.
- Quer dizer então que você aceitou trocar
Cibele? – indagou rispidamente Paulo ao ver sua esposa no banco do motorista.
Hanz olhou-o com reprovação pois ali não era
um local seguro para discutirem sobre aquilo pois não muito longe dali estava o
grupo de desocupados que sempre estava ali só de olho no que se passava na
travessa.
- O assunto já está decidido Paulo, chega
dessa discussão. Não fique com raiva de mim, eu sei que você se preocupa comigo
meu amor, mas acho que sou capaz de saber o que é melhor pra mim. – fala Cibele
desligando o carro.
- Tá certo então. Espero que você consiga se
sair bem. Não adianta eu falar com você mesmo. Você não me dá mais ouvidos...
Quer saber? Tô indo pra casa, me encontra lá, acho que você não tá precisando
da minha carona. Até mais aí pessoal.
Paulo nem sequer esperou pela resposta de sua
esposa, foi para dentro do seu carro.
- Que saco, pelo visto não adiantou nada o
que eu falei com ele... fala Renzo irritado com a atitude do amigo, ou
ex-amigo, nem ele mesmo sabia como referir-se à Paulo agora. Também estava
cansado das atitudes dele.
- Ele é cabeça dura Renzo. Eu mesma já
conversei muito com ele. Mas enfim, deixa ele pra lá. Tô preocupada com a
“viagem” de hoje, isso sim. – Cibele dá uma piscada para Hanz disfarçando o
verdadeiro significado da palavra viagem por causa do grupo de rapazes que
encontrava-se próximo dali, em silêncio, sem sequer disfarçar que não estavam
perdendo nenhum detalhe do que se passava ali.
- É Cibele, deixa pra lá. A “viagem” será
legal, tudo será uma maravilha. – fala Hanz vendo o carro de Paulo indo embora.
Renzo, que também se irrita com o grupo de
rapazes não consegue se conter.
- O que estraga é esse bando de gente
desocupada que não faz nada da maldita vida e só fica cuidando da vida dos
outros. – ele fala bem alto pro grupo de rapazes ouvir na esperança de que
algum deles se manifestasse.
Hanz já havia comentado com ele que tinha se
estranhado a algum tempo atrás com Alex, e desde então Renzo nutria uma vontade
crescente de que ele viesse dizer-lhe algo ofensivo para aplicar-lhe um
corretivo.
Mas nenhum deles se manifestou, era óbvio que
eles sabiam quem Renzo era e provavelmente não estavam com vontade de levar uma
surra naquela noite.
- Bom rapazes, é melhor eu ir pra casa
também, melhor não dar ainda mais motivos pro Paulo ficar falando na minha
orelha. Fica assim então, qualquer coisa eu dou uma ligada pro Jean pra saber
de alguma novidade. – fala Cibele despedindo-se de Hanz e de Paulo.
- Tá certo então Cibele, espero que faça sol
por lá pra você poder aproveitar bastante. – fala Hanz retribuindo a piscada.
Ainda bem que Paulo não está presente nesse
momento pois essas piscadelas certamente seria motivo para mais discussão.
- É, eu também espero.
- Se cuida heim Ci, vê se manda notícias
heim, senão a gente fica preocupado. – fala Renzo.
A seqüência de piscadas de olho chega a ser
cômica, os “olheiros” da travessa não desconfiam de nada.
Cibele entra no jipe e parte, de início com o
carro aos trancos, mas finalmente parece pegar o jeito e prossegue, lenta, mas
tranqüilamente.
- Espero que ela dê conta do recado fiote. –
cochicha Renzo.
- É, eu também espero. Mas eu confio nela,
tudo vai sair certinho. Em quem eu não tô confiando nem um pouco é no Paulo,
hoje faltou pouco pra eu sair na porrada com ele. O cara hoje tá demais, ele
perdeu completamente o bom senso.
- Eu percebi fiote, ele realmente tá
irritante, tá difícil de agüentar mesmo. Hoje ele pegou pesado, sobrou até pra
mim. Eu conversei com ele, mas não descobri muita coisa, e pelo jeito também
não adiantou nada os conselhos que eu dei pra ele, o bicho é teimoso feito uma
mula fiote...
- Vamos lá pra dentro, é melhor pra gente
trocar uma idéia... fala Hanz conduzindo o amigo para dentro fazendo sinal para
os rapazes que permaneciam à toa na travessa.
- Gente desocupada é fogo!!! Será que alguém
sabe o que é mulher??? – fala bem alto Renzo passando pelo portão. Realmente
ele está doido para que algum deles venha tirar satisfação com ele.
Com certeza eles sabiam que as indiretas eram
para eles, mas e a coragem para retrucar a provocação de Renzo?
Ambos conversaram mais um pouco mas Hanz logo
demonstrou sua disposição em ficar um tempo isolado, concentrando-se no que
ainda teria que fazer naquele dia.
Mas a noite ainda reservava-lhe surpresas que
fariam seus planos mudarem.
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